São Miguel do Oeste – A gestante chegou ao hospital às 10h45 da
manhã. Estava no início do trabalho de parto, com um quadro anormal de
hipertensão. O médico que a atendeu, diretor daquele hospital, mandou a
paciente esperar pela obstetra de plantão. O caso aconteceu em São
Miguel do Oeste em 2004.
Diante do quadro crítico da gestante, uma enfermeira ligou para a
médica. Esta, por sua vez, estava em outra cidade e telefonou ao
diretor, recomendando a imediata transferência da grávida para outro
lugar com melhor estrutura e com atendimento específico na área. Porém,
segundo o processo, “negligentemente, o médico-diretor deixou de atender
a sugestão, diante de sua imperícia quanto ao diagnóstico produzido a
partir do estado apresentado pela paciente”. Além disso, logo em
seguida, ele saiu e foi viajar, embora soubesse que a única obstetra
disponível se encontrava fora da cidade.
A mulher esperou no quarto, com muitas dores no ventre e sem nenhum
atendimento, durante cinco horas. A obstetra chegou ao hospital por
volta das 16h, percebeu a gravidade da situação – a paciente estava em
período avançado de parto e os sinais vitais da filha já eram diminutos,
com batimentos cardíacos inaudíveis – e decidiu pela intervenção
cirúrgica. Convocou um anestesista e um pediatra – eles nem sequer
compunham o corpo clínico da instituição, reforçando a tese de
precariedade da assistência prestada às pacientes.
Feita a cesariana, constatou-se que a menina ingeriu mecônio –
material fecal produzido pelo próprio feto – e isso só aconteceu, como
mostram os autos, pela demora na realização do parto. A criança foi
encaminhada ao hospital de um município vizinho, mas não resistiu e
morreu três dias depois.
A defesa do hospital alegou que a morte não decorreu do atendimento
tardio à gestante, “mas por causa dos problemas de saúde congênitos da
criança, que impediram um regular funcionamento de seu sistema cardíaco
e, por consequência, do sistema respiratório”. Entretanto, para o
relator da matéria, desembargador Luiz Fernando Boller, “o acervo
probatório é pleno e absoluto quanto à omissão de assistência pelo
galeno diretor da instituição hospitalar que, após realizar o primeiro
atendimento à paciente, mesmo diante do alarmante quadro de saúde que
esta apresentava, deixou o hospital e partiu em viagem particular”.
O relator concluiu que o óbito do bebê foi provocado por complicações
decorrentes da letargia na intervenção cirúrgica para sua retirada do
ventre materno, em razão do diagnóstico errôneo do médico. Boller
ressaltou ainda que a demora da obstetra, a qual se encontrava na
qualidade de plantonista para situações de emergência, e o retardo em
encaminhar a mãe a um outro hospital também contribuíram para o óbito.
Com isso, por unanimidade, a 1ª Câmara de Direito Público do TJSC
manteve a condenação do hospital e promoveu readequação no valor da
indenização, fixada em R$ 100 mil. Na ação penal, em 1ª e 2ª instâncias,
o médico foi condenado por homicídio culposo qualificado. A médica
obstetra também respondeu a uma ação penal, mas foi absolvida.
Além do relator, participaram do julgamento os desembargadores Paulo
Henrique Moritz Martins da Silva e Pedro Manoel Abreu. A sessão ocorreu
no dia 4 de junho.
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