segunda-feira, 17 de julho de 2017

Vice-presidente do CRM diz que hospitais ignoram manuais de segurança em cirurgias

Cirurgião afirma que nem todo erro é tão absurdo quanto parece
 
Segundo o CRM, muitos hospitais não seguem os protocolos de segurança
Ministério da Saúde/Creative Commons
 
Imagine entrar numa sala de cirurgia para amputar a perna esquerda e sair de lá sem a direita. Ou, quem sabe, precisar se submeter a um segundo procedimento cirúrgico porque, no primeiro, esqueceram uma tesoura dentro do seu corpo. E o que falar de entrar no hospital para operar a hemorroida e sair de lá sem a vesícula?
 
De acordo com o vice-presidente do Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso (CRM-MT), o médico cirurgião Gabriel Felsky dos Anjos, todos esses casos são reais e poderiam ter sido evitados com ações simples: perguntar ao paciente quem ele é e o que está fazendo ali e contar – antes e depois da cirurgia – quantos instrumentos foram utilizados.
 
As medidas fazem parte de um manual de segurança lançado em 2008 pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e editado em 2009 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O texto está disponível na internet, para qualquer pessoa acessar. Quase 10 anos depois de seu lançamento, no entanto, nem todos os hospitais brasileiros adotam as normas previstas.
 
Para o vice-presidente do CRM-MT, é uma questão cultural. Segundo ele, as medidas sofrem uma certa resistência, tanto de médicos, enfermeiros e administradores de hospitais, quanto dos próprios pacientes porque se tem a impressão de que são uma perda de tempo.
 
“As pessoas tendem a querer fazer tudo o mais rápido possível. O que elas não compreendem é que, apesar de parecer uma perda de tempo, com essas medidas você está preservando a integridade do paciente e evitando que erros aconteçam”, argumenta.
 
 
 
Amputação errada

Apesar de parecerem grosseiros, os erros citados são compreensíveis para quem conhece a rotina de um hospital, diz o vice-presidente do CRM-MT. O episódio mais recente ocorreu em Cuiabá, com Marcos Antônio Nascimento, de 46 anos, que morreu no mês passado após precisar passar por uma segunda amputação, porque a perna errada foi cortada na primeira cirurgia.
 
O caso ainda está sendo investigado pelo CRM-MT e pela Prefeitura de Cuiabá. A Secretaria Municipal de Saúde – responsável pelo Pronto Socorro, onde Marco Antônio estava internado – não divulgou o motivo da cirurgia. Gabriel Felsky afirma, entretanto, que, em situações desse tipo, nem sempre o médico tem condições de, apenas olhando o paciente, identificar qual perna ou braço precisa ser amputado.
 
“Lógico que existem casos óbvios, mas, muitas vezes, não dá para ver o problema só observando. Tem casos, por exemplo, de tumor ósseo. O tumor está dentro do osso, então, por fora, as duas pernas são normais. O paciente sente dor, mas a dor você não enxerga”, explica.
 
Para situações assim, é que o manual da OMS e da Anvisa determina que uma série de perguntas sejam feitas ao paciente, antes de ele ser anestesiado. Ele precisa, por exemplo, dizer seu nome completo, sua data de nascimento, se sabe qual cirurgia fará e de que lado do seu corpo ocorrerá essa operação.
 
Segundo Felsky, é previsto, inclusive, que o próprio paciente marque, com uma caneta, o local do seu corpo que será operado. Todas as informações precisam ainda ser checadas com os dados que constam no prontuário médico – a lista de exames que a pessoa realiza antes de uma cirurgia. “A gente checa depois porque tem casos de o paciente estar tão nervoso que ele erra”, diz o médico.
 
CRM investiga morte de homem que teve a perna errada amputada no Pronto-Socorro
Ednilson Aguiar/O Livre
Prevenção

A lista de procedimentos de segurança também determina algo que parece óbvio: que antes de iniciar qualquer procedimento cirúrgico, se verifique se todos os materiais a serem utilizados e as pessoas da equipe médica estão na sala de cirurgia.
 
“Existiram casos em que o anestesista fez a anestesia e entubou o paciente e cadê o cirurgião? O médico nem estava no hospital. Não estava nem sabendo que teria que operar alguém naquele dia”, conta o vice-presidente do CRM.
 
No caso do material a ser utilizado, de acordo com Felsky, o manual de segurança determina que ele seja contado, listado e que se verifique se está funcionando corretamente antes de a primeira incisão no paciente ocorrer. A contagem também deve ser repetida no final da operação.
 
“O material de cirurgia, desde tesouras, pinças, as compressas que são usadas para secar o sangue, tem que ser checado: quantos entraram e quantos saíram. Acontece de o médico esquecer dentro do paciente”, diz.
 

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