sábado, 29 de novembro de 2014

Drauzio Varella


Texto retirado da entrevista dada ao Programa Roda Viva em 30/8/2004.

 http://www.maisinterativa.com/Fotos/drauziovarella_dinap_1107.jpg


Paulo Markun: Boa noite. Ele tornou-se conhecido em todo o Brasil por suas campanhas públicas de prevenção e de combate ao câncer e especialmente à aids. Envolvido com o universo dos doentes terminais, acaba de lançar um novo livro, em que mostra como a dor e a perspectiva da morte transformam o comportamento de pacientes e familiares. O médico e escritor Drauzio Varella é o entrevistado desta noite do programa Roda Viva.

Paulo Markun: Para entrevistar o médico cancerologista Drauzio Varella, nós convidamos Roseli Tardelli, criadora e editora-executiva da Agência de Notícias da Aids; Roldão Arruda, repórter da editoria de política do Jornal Estado de S. Paulo; Mônica Teixeira, editora especial de saúde, ciência e tecnologia da TV Cultura; Cristiane Segatto, editora de saúde, ciência e tecnologia da revista Época; Michael Laub, editor de literatura da revista Bravo e Maria Helena Pereira Franco, professora titular de psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e coordenadora do Laboratório de Estudos sobre o Luto da PUC, é também integrante do Instituto de Psicologia Quatro Estações. O Roda Viva, você sabe, é transmitido em rede nacional para todos os estados brasileiros e para Brasília também pela rede pública de televisão. Boa noite, Drauzio.  

(...)
 
Cristiane Segatto: Essa questão do erro médico – seja o erro de avaliação, seja mesmo o erro técnico– é uma coisa muito forte no livro. Ao assumir esses erros, quer dizer, isso teve um efeito terapêutico para o senhor? Foi uma forma de exorcizar alguns fantasmas ao longo da carreira?

Drauzio Varella: Eu acho que nós temos que falar com franqueza a respeito do erro médico. O que é um erro médico, em primeiro lugar? É um erro, um erro de avaliação, um erro de não escolher uma melhor solução para aquela situação. [Você] não percebeu, na hora em que estava escolhendo, achou que estava escolhendo a melhor, mas depois a evolução te mostrou que [aquilo] não era a melhor solução. Agora, isso acontece? É lógico que acontece. Imagina, nós temos que tomar... em uma sociedade, todas as pessoas erram, só os médicos é que são infalíveis? Isso é o que os médicos antigos diziam ou o que o Papa dizia também, que era infalível, não é? Mas a verdade é que nós erramos, todos os dias nós erramos. Eu não acho grave errar, porque errar faz parte da vida. Só não erra quem não faz. Se você está tomando decisões e, às vezes, decisões que você tem que tomar muito depressa, muitas vezes sem dormir, que é o que acontece muito com os médicos... Você pega aí uma quantidade enorme de médicos que trabalham a noite inteira e emendam o dia seguinte inteiro, coisa que é proibida pela legislação do trabalho para todas as profissões e na medicina é uma tradição. O médico trabalha o dia inteiro, vai para o plantão à noite, às vezes, passa a noite inteira acordado, emenda o dia seguinte, e vai para casa oito horas da noite do outro dia, quer dizer, é um absurdo isso! Como você quer que uma pessoa dessa, numa hora, não se atrapalhe ou não faça um mau julgamento, não tenha uma observação equivocada? O grave não é isso, o grave não é você errar, o grave é você não perceber que errou. Sabe, se você vem com uma pneumonia, eu lhe dou um antibiótico e esse antibiótico não é o mais adequado para aquela situação, eu te mando embora e nunca mais vou te ver. E você, como estava sendo medicada, você fica tomando remédio uma semana, dez dias, 15 dias e vai ficando cada vez pior, mas acha que é assim mesmo, porque você esta tomando remédio que o médico mandou, isso é muito grave. Agora, se eu te digo “olha, você vai tomar tal antibiótico, me telefona daqui a 48 horas para me contar o que aconteceu com a sua febre” e você me liga e me diz: “olha, a febre aumentou”, [e eu digo] “se aumentou volta aqui que eu quero te ver de novo”... Sabe, você corrige o erro e esse erro às vezes nem é um erro propriamente; você dá um antibiótico que age em 80% daqueles casos, mas a cada dez [para] que você receita, dois não respondem. Mas você precisa reconhecer esses dois; isso é o importante, isso diferencia o bom médico do médico incompetente.


 

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