terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Vara especializada em saúde: exemplo gaúcho

Por Frederico Vasconcelos - 28/05/13


- Martin Schulze: Conhecimento do sistema garante prestação de saúde mais eficaz.

- Pedido de vista adia votação de proposta para criação de varas especializadas.

Sob o título “Vara Especializada em Saúde?”, o texto a seguir é de autoria do juiz de direito Martin Schulze, do Rio Grande do Sul. O magistrado tem experiência como coordenador do Comitê Executivo Estadual, vinculado ao “Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde” do Conselho Nacional de Justiça.
A pedido do Blog, Schulze analisa a proposta de criação de varas especializadas em questões de saúde apresentada ao CNJ pelo presidente da Embratur, Flávio Dino.
Nesta terça-feira, o Conselho começou a examinar o assunto. O relator, conselheiro Ney Freitas, votou parcialmente a favor do pedido. A conselheira Maria Cristina Peduzzi pediu vista.
 
Previsto na pauta de hoje, o Conselho Nacional de Justiça iniciou o exame da pertinência ou não da especialização de varas em feitos da saúde.
A matéria não é pacífica, face fortes argumentos a sustentar posições a favor ou contra.
 
Minha posição é favorável à especialização, razão pela qual elencarei alguns argumentos neste sentido.
O ordenamento constitucional prevê que os serviços de saúde no Brasil possam ser prestados de forma pública ou de forma privada e, ainda, por um modelo suplementar. A organização do Sistema Único de Saúde é complexa, regulando todas estas atividades.
 
Esta complexidade exige uma adequada qualificação dos agentes do sistema de justiça, modo a que as decisões judiciais, ao atender as necessidades do cidadão, também respeitem, na medida do possível, os limites da contratualidade, no que se refere à medicina suplementar, e a organicidade administrativa, no que se refere à medicina pública.
 
Para alcançar a necessária qualificação, para a devida compreensão do emaranhado de sutilezas legais, administrativas, contratuais e médicas, envolvendo gestores, prestadores, médicos e pacientes, o operador do direito precisa ter um interesse especial na matéria, para manter o equilíbrio entre os interesses do sistema de saúde e os interesses da população.
 
No Rio Grande do Sul, o Tribunal de Justiça criou, em Porto Alegre, uma Vara da Fazenda Pública especializada em Saúde. Inicialmente com um juizado e hoje conta com dois juizados. A experiência demonstrou a eficácia da especialização. Um trabalho conjunto entre os magistrados e os defensores públicos apontou pontos de ineficácia administrativa junto aos gestores e permitiu uma mediação entre defensoria e gestor que reduziu significativamente a judicialização (cerca de 80%), sem, contudo, deixar de atender as demandas de saúde da população, pois os encaminhamentos foram resolvidos na esfera administrativa.
 
A mesma especialização no âmbito da medicina suplementar, principalmente no que concerne às demandas que postulam uma prestação de saúde, deverá trazer benefícios equivalentes.
O argumento principal dos que advogam a não especialização é o de que haveria concentração de poder em poucos magistrados e o cidadão ficaria refém desses, fosse o entendimento no sentido de negar a prestação de saúde. No exemplo referido, eventual concentração estaria neutralizada pela existência de dois juizados.
 
De todo modo, o conhecimento mais profundo, por parte dos magistrados, do funcionamento do sistema de saúde, garante uma prestação de saúde mais eficaz, pois determinadas terapias dentro dos protocolos, assegurando ao cidadão um tratamento dentro dos padrões reconhecidos internacionalmente, assegurando também aos gestores e prestadores medidas deferidas dentro dos critérios estabelecidos. Por outro lado, quando deferidas medidas fora dos protocolos, os gestores terão ciência de que a decisão foi dada criteriosamente, com base em evidências de que a situação concreta estaria a exigir a exceção.
 
A especialização proporciona, também, ao magistrado, condição de garantir a eficácia de sua decisão, pois terá conhecimento acurado dos meandros do sistema de saúde, eficácia esta que garante ao cidadão a presteza do cumprimento do determinado judicialmente.
 

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