Diagnóstico e tratamento são as ações primordiais da prática médica e devem ser feitos seguindo um criterioso embasamento científico
Por Dr. Luis Claudio Correia
Em meados do século XX, a evolução tecnológica e científica trouxe-nos tratamentos de grande relevância. Antes disso, a maioria das condutas eram empíricas e inefetivas. Fazíamos uma medicina que tentava apenas reduzir o sofrimento ou proporcionar a falsa ideia de que algo benéfico estava sendo utilizado. No início do século passado, não havia antibióticos, anti-hipertensivos, medicamentos para baixar o colesterol ou marca-passos.
Esta fase foi seguida de uma grande evolução nos últimos 50 anos, tirando a medicina de um estágio medieval para uma prática efetiva. Neste contexto, o primeiro ensaio clínico publicado (British Medical Journal) data de 1948. Os pesquisadores que conduziram este trabalho comprovaram pela primeira vez que um antibiótico (estreptomicina) reduzia significativamente a mortalidade de pacientes com tuberculose quando comparado ao tratamento limitado ao repouso. Começava a era da medicina baseada em evidências.
Por outro lado, no início do século XXI, passamos a experimentar outro fenômeno: a medicalização da população. O principal mecanismo criador da medicalização foram e são novas definições de doença, caracterizadas pela redução dos limites de referência do que antes considerávamos normal. É comum que a redução destes limites ocorra sem o devido embasamento científico, sendo mais motivados pelo afã de prevenir doenças ou por conflitos de interesses. Isso faz com que, do dia para a noite, surjam populações inteiras de novos doentes, antes considerados normais. Está cada vez mais difícil ser normal!
A sobreutilização de procedimentos diagnósticos [overdiagnosis] ocorre quando é realizado um diagnóstico verdadeiro, porém desnecessário, com maior potencial de causar danos do que benefícios. Este fenômeno decorre da cultura do check-up, propagada pelo lobby em prol do excesso de exames em pessoas saudáveis. Em contrapartida, o pensamento médico-científico propõe que a realização de exames se justifique pela existência de um benefício clínico advindo do diagnóstico, e não pela falsa perspectiva de proteção gerada pelo exame. Em pessoas saudáveis, assintomáticas, há exames que devem e outros que não devem ser realizados. A sobreutilização de procedimentos diagnósticos [overdiagnosis] refere-se ao uso do exame em qualquer pessoa, independente de seus fatores de risco ou quadro clínico. Quando leva à adoção de terapias desnecessárias, surge a sobreutilização de procedimentos terapêuticos [overtreatment].
Diagnóstico e tratamento são as ações primordiais da prática médica e devem ser feitos para quem precisa, na hora que se precisa e com criterioso embasamento científico.
PROQUALIS
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