Maria José só recebeu uma parte da indenização há menos de quatro anos, depois da morte do filho Daniel / Foto de Bobby Fabisak/ JC Imagem |
O pagamento de indenizações às vitimas da contaminação ocorrida em 1996, no Instituto de Doenças Renais (IDR), em Caruaru, Agreste de Pernambuco, está parado. Aliás, só começou em 2012, 16 anos depois da sentença que responsabilizou os donos da clínica por danos morais em razão do alto teor de cianobactérias presentes na água da diálise e de outros problemas do serviço. Embora os pedidos de execução tenham prioridade na 2ª Vara Cível da cidade, faltam bens a serem penhorados. A clínica não mais existe como pessoa jurídica.
“Não conseguimos pagar nem a metade dos valores”, afirma o juiz da 2ª Vara Cível, José Tadeu dos Passos e Silva. Segundo ele, cabe aos advogados das famílias prejudicadas indicar os bens dos proprietários do antigo IDR, o que não tem sido fácil. Quanto mais demora, maior é o tempo para que os condenados se desfaçam de algum patrimônio. A sentença das indenizações foi concedida em resposta à ação civil pública movida pelo Ministério Público Estadual, no mesmo ano da tragédia. Recursos junto a diferentes instâncias do Judiciário atrapalharam seu cumprimento.
Em 2012, o juiz só conseguiu liberar pagamentos depois que a advogada Maria da Conceição de França, representante de um grupo de 11 pessoas, descobriu que os donos da clínica tinham outro serviço, em Petrolina (Sertão), e recebiam recursos do SUS. A unidade foi desabilitada pelo governo logo depois. “Consegui bloquear cerca de R$ 1 milhão, que foi rateado entre sobreviventes e familiares”, explica Passos e Silva. Para alguns dos beneficiários, o valor não ultrapassou R$ 4 mil, menos de 10% do esperado (100 salários mínimos para dependentes dos falecidos e 90 para sobreviventes).
“Pobre ganha, mas não leva”, diz a advogada Maria da Conceição de França, que defende agricultores, garis, donas de casa. Mesmo assim, ela não perde as esperanças. No processo criminal, os proprietários do IDR foram absolvidos, só restando a condenação civil, por danos morais. O JC tentou ouvir os donos do instituto, mas não conseguiu localizá-los.
O juiz Marupiraja Ramos, autor da condenação em 1996, concluiu o julgamento em tempo recorde, cinco meses, quando avaliou cinco mil páginas. Para ele, o direito à indenização, reconhecido mas não garantido às vítimas, causa frustração e revela os problemas do Judiciário. O Novo Código de Processo Civil, que entra em vigor este ano, pode favorecer medidas cautelares mais ágeis em situações parecidas, explica. Com atualizações, a reparação determinada por Marupiraja chegaria hoje a cerca de R$ 600 mil, calcula. Ao menos 80 famílias das mais de 140 atingidas pela tragédia teriam requerido indenização.
“É falta de humanidade. Minha irmã, Cláudia Regina de Lima, tinha 21 anos em 1996, vomitava sangue e sobreviveu ainda até 2001. Não fomos indenizados e a filha dela, uma criança na época, não teve sequer direito à pensão do INSS”, conta Wilma de Lima, 34. Logo após a morte de Cláudia, ela também teve diagnóstico de insuficiência renal e passou a reviver a tragédia toda semana quando era submetida à hemodiálise. “Graças a Deus consegui meu transplante.”
Maria José da Silva, 76, mãe de Daniel Barbosa, outra vítima já falecida, e Quitério Marcos da Silva, 41, paciente que recentemente fez transplante, chegaram a receber três parcelas do dinheiro, no entanto, insuficientes para cobrir despesas atuais ou compensar as anteriores com deslocamento, alimentação, compra de remédios e exames laboratoriais. As famílias não tiveram assistência psicológica nem de serviço social. Nenhum ambulatório de referência foi aberto para que os sobreviventes pudessem ser acompanhados a longo prazo.
Quitério, sobrevivente da contaminação no IDR, quer o valor integral decretado pela Justiça Foto de Bobby Fabisak/ JC Imagem |
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