O estudo realizado na doutrina permitiu verificar que, se um paciente vier a falecer por erro médico, poderá o médico ser responsabilizado e apenado, o que na prática deveria ser feito de forma justa, aplicando-se a pena prevista no art. 121, §§ 3º e 4º, do Código Penal, o mais próximo da pena máxima, senão a máxima, acrescida de 1/3 da causa de aumento, pela inobservância de regra técnica de profissão e devido à quebra do dever de cuidado, à situação de total dependência e confiança do paciente em relação ao médico.
Ressalta-se que a pena varia entre 1 (um) e 3 (três) anos, que em se tratando de réu primário e pelo quantum da pena, receberá todos os benefícios que a lei penal concede, como, por exemplo, a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, a teor do art. 44 do Código Penal.
A responsabilização do médico por crime de homicídio culposo resulta da violação dos deveres do médico para com seu paciente e essas violações são, muitas vezes, praticadas por mero hábito; mau hábito, que pode custar a vida de uma pessoa.
As anotações nas fichas médicas e nos prontuários, em sua maioria, são superficiais e escritas com letras ilegíveis, dificultando desde a ministração correta dos medicamentos pela equipe de enfermagem a não identificação do que efetivamente foi feito ou deixou de ser feito a favor da vida e saúde do paciente.
Não bastasse a ausência de conhecimentos médicos dos profissionais do Direito, o descuido e relapso de alguns médicos na elaboração destes documentos também dificultam na obtenção de provas para um melhor conjunto probatório em uma ação penal por erro médico.
Cada exame solicitado, cada parecer requerido deve ser avaliado pelo médico solicitante, até porque cabe ao médico que acompanha o paciente, verificar a evolução da enfermidade e do quadro clínico dele, devendo o médico estar apto a solicitar outros procedimentos e/ou intervenções que a situação do paciente venha a exigir para manutenção de sua vida.
Essas violações aos deveres médicos dão-se por meio da imprudência, imperícia e negligência que resultam em erros médicos, podendo daí surgir o homicídio culposo.
O que se observa pelo que foi exposto, é que nas duas primeiras modalidades, imprudência e imperícia, há um agir, uma ação. Mas, a negligência é modalidade que supera seu caráter colaborador de obtenção do resultado morte.
A negligência chega a ser mais cruel das três modalidades, porque o paciente que encontra-se acamado, totalmente dependente da atuação médica, indefeso, à espera de procedimento que possa salvar sua vida ou reduzir seu sofrimento.
Na negligência, o paciente encontra um médico que poderia cumprir com seu mister da melhor forma, mas deixa de agir por indolência, desleixo, quando, por exemplo, deixa paciente em estado grave sem indicar nenhum procedimento, quando o caso requeria, e vai dormir no repouso dos médicos, demonstrando assim que a negligência é a mais desumana das três modalidades; o que deverá ser considerado pelo magistrado no momento de aplicar a pena ao médico que age dessa forma.
A grande quantidade de pacientes a serem atendidos, seja em consultórios médicos, seja nos hospitais públicos ou particulares não pode jamais servir de base para tentar justificar incompetência, desleixo ou imprudência. Cada atendimento é feito em uma pessoa, considerada em sua individualidade e personificação única, com nome e sobrenome, mesmo que não reconhecido na classe alta da sociedade; é pessoa, digna de tratamento médico adequado e humano.
Conclusão
Uma vez constatada a existência da morte de um paciente que estava sob cuidados médicos, em que aquela possa ter ocorrido pela má prática médica, havendo o nexo causal, inicia a jornada árdua de comprovar o erro médico e a culpa do profissional de Medicina através da ocorrência dos pressupostos, pois na falta de ao menos um, a responsabilidade inexistirá.
A esse respeito, pode-se perceber que, tanto a doutrina como a jurisprudência tem convergido para a responsabilidade penal do médico, especificamente por homicídio culposo, devendo os magistrados adotar os ensinamentos e orientações técnicas-doutrinárias a respeito do assunto.
Assim, verificando-se a ocorrência de todos os pressupostos da responsabilidade médica e tendo o médico agido com imprudência, negligência ou imperícia, surgirá a responsabilidade penal e deverá o médico arcar com o peso do óbito causado ao paciente.
O erro médico tem sido cada vez mais, tema explorado nas novas literaturas e em ciclos de debates, o que significa que as pessoas estão tornando-se, dia após dia, atentas aos problemas que envolvem os maus atendimentos médicos.
A dificuldade na obtenção de provas técnicas para a responsabilização do médico pelo crime de homicídio, não pode servir de supedâneo para que diversas mortes que poderiam ser evitadas fiquem relegadas ao esquecimento, com exceção da família, que suportará por toda a vida o peso da morte de seu ente querido, que teve a vida ceifada de maneira precoce e absurda.
Devido à falha de um atendimento médico em que se tinha uma pessoa, viva, carregada com sua história, experiências e emoções, a qual, porém, necessitava de cuidados médicos, após um erro médico fatal, passa-se a ter um cadáver para ser periciado pelo médico-legista, agora de propriedade não mais da família e sim do Estado, e um fato jurídico a ser discutido no Tribunal, em meio a tantos "papéis frios" que farão parte dos autos de uma ação penal por crime de homicídio culposo.
Buscar essa responsabilização não se trata de engessar a atuação médica, de perseguir os bons profissionais médicos ou mesmo paralisar o desenvolver da ciência médica. Decorre da própria consolidação do princípio da dignidade da pessoa humana e das garantias que se tem em uma República Democrática de Direito e, acima de tudo, buscar essa responsabilização, decorre do ideal natural de Justiça.
Texto retirado do artigo "O médico como réu: um enfoque jurídico-penal acerca do homicídio culposo decorrente de erro médico" - Rubenita de Andrade Lessa P. Gomes
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