terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Corrupção no setor de saúde: Um grande desafio na perspectiva de três grandes países

O setor movimenta valores gigantescos e ainda é completamente suscetível a irregularidades iminentes, comprometendo a utilização dos recursos para melhora dos serviços prestados à sociedade.


Cynthia Catlett
Cynthia Catlett - Managing Director da divisão de Consultoria Técnica
 e Investigativa em Apoio a Litígios da FTI Consulting no Brasil.
A prática de pagamento de propina a médicos não é novidade, tampouco é uma prática exclusiva no Brasil. O setor de saúde movimenta cerca de 3 trilhões de dólares mundialmente por ano e está sujeito a diversas fraudes, como comissões ilegais para encaminhamento de pacientes, notas superfaturadas, falsificação de registros e assinaturas, solicitação de equipamentos e produtos – como famigerado caso das próteses – desnecessários, e, o mais comum, requisições falsas – faturas de serviços não prestados ou excessivos.
 
 
No Brasil, os casos de corrupção envolvendo o setor são sofisticados a ponto de utilizarem quase toda a estrutura governamental existente. Além do pagamento a médicos, existem supostos pagamentos a fiscais, subsídios desviados, licitações fraudadas, liminares judiciais utilizadas para obrigar instituições governamentais a pagar por procedimentos desnecessários.
 
O sistema de saúde norte-americano também apresenta características que propiciam mecanismos de corrupção, como por exemplo: os serviços de assistência médica são prestados por empresas privadas que são, ocasionalmente, pagos por programas governamentais; os fornecedores de assistência médica (médicos e empresas) são livres pra determinar quais os cuidados necessários (podendo haver faturamento de procedimentos supérfluos ou inexistentes) e as empresas fornecedoras de equipamentos e medicamentos estão em posição privilegiada de negociação com funcionários de saúde; além do mais, o grande volume de transações e produtos diluem informações de possíveis superfaturamentos, tornando mais difícil a identificação imediata de desvios.
 
Mas os escândalos relativos à corrupção não são apenas atributos ocidentais. A China, por exemplo, foi palco de grandes casos de corrupção em meados de 2012 – ano no qual o Partido Comunista mudou suas lideranças – e que resultaram na prisão perpétua ou pena de morte para figuras do alto escalão, como o ex-vice-presidente da Comissão Nacional para Desenvolvimento e Reforma e de um ex-dirigente do partido, entre outros, condenados por casos de corrupção, desvio de verbas, suborno e abuso de poder.
 
Desde então o governo se viu forçado a tomar medidas anticorrupção que evitassem irregularidades e retomassem a confiança no governo, já que quase metade da população chinesa acredita que a corrupção tem crescido desde 2009, o que poderia ocasionar descontentamento e agitação interna.
 
Com relação ao modelo de saúde chinês, ele é de certo modo semelhante ao brasileiro: existe um sistema público (sendo mais focado em áreas rurais, atualmente) e um privado. No entanto, o sistema público sofre com fundos escassos e funcionários mal pagos (principalmente médicos, diferindo do Brasil que, em contraste, oferece boa remuneração para estes profissionais), o que leva à utilização de uso de propinas para que cirurgias sejam efetuadas, além de solicitação de testes e procedimentos desnecessários para obtenção de mais dinheiro. O setor privado, em contrapartida, é extremamente caro, levando diversas famílias à pobreza ou a débitos de longo prazo, assim como ocorre nos Estados Unidos.
 
Apesar desse cenário negativo, existem medidas que podem ser tomadas para prevenir essas irregularidades, como: efetivo controle contábil e de recursos; transparência e participação popular na formulação, execução e análise da alocação de recursos; existência de alternativas privadas ao sistema de saúde público, o que poderia estimular a competitividade; campanhas de conscientização para que a própria população atue na fiscalização destes serviços; punição rigorosa para casos comprovados de fraude e avaliação de qualidade e desempenho do quadro de pessoas do setor.
 
Entretanto, nada disso vem sendo feito. O setor movimenta valores gigantescos e ainda é completamente suscetível a irregularidades iminentes, comprometendo a efetiva utilização dos recursos para melhora dos serviços prestados à sociedade e colaborando assim para uma perpetuação da corrupção sistêmica.
 

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