Nesta semana, um bebê de 11 meses morreu, por não resistir a fortes sintomas de vômito e diarreia. Ele veio a óbito no Pronto Atendimento Infantil (PAI) após ter sido atendido e liberado por um profissional do Departamento de Saúde da Criança e do Adolescente, em Juiz de Fora. A família do menino registrou denúncia sobre o atendimento à Polícia Militar (PM) e depois ao Conselho Regional de Medicina (CRM), e o caso, encaminhado à Polícia Civil (PC), já está sendo investigado. Junto ao CRM, foi encaminhado um pedido de abertura de processo administrativo para discutir a conduta ética do médico responsável pelo atendimento.
Com esse caso vindo à tona, a preocupação da população com o tipo de atendimento oferecido pelos médicos se aflora. Nossa equipe conversou com dois leitores que já passaram por situações de falta de atenção adequada durante consultas em hospitais da cidade.
No primeiro caso, que ocorreu no início deste ano, o leitor conta que precisou levar o pai, que à época tinha 84 anos, ao hospital durante uma crise aparentemente alérgica. “Demoraram muito a atendê-lo, alegando que priorizavam os casos de urgência e emergência. Eu precisei discutir para que meu pai fosse atendido. Foi receitado um xarope e ele foi liberado”, conta. Como não confiou no atendimento, ele levou o pai a outro hospital, onde foram pedidos vários exames para comprovação do caso. “Ele ainda está tomando remédios e realiza exames até hoje”, afirma o homem, cujo pai sofre de arritmia cardíaca e, segundo ele, tem várias crises.
Outra leitora, de 34 anos, que não quis se identificar, contou ao Diário Regional que a tia faleceu em um hospital de Juiz de Fora após cinco dias de internação e um diagnóstico equivocado. “Ela deu entrada no hospital com infecção urinária, depois foi diagnosticada com constipação intestinal. Realizaram uma lavagem intestinal que não funcionou e isso causou obstrução no intestino, por conta de uma perfuração”. A tia da mulher, que tinha 49 anos, sentia muita dor e, como os profissionais demoraram a perceber a obstrução, não houve tempo de fazer uma nova cirurgia e ela não resistiu. A família acredita que a demora no diagnóstico correto tenha contribuído para o óbito da mulher, mas não chegou a registrar nenhuma denúncia a respeito.
Casos de erros médicos e negligência, atualmente, são motivo de 30 mil processos judiciais indenizatórios em todo o país, de acordo com pesquisa realizada pelo advogado Raul Canal, presidente da Anadem (Sociedade Brasileira de Direito Médico e Bioética). Os dados foram observados de 2000 a 2015 e são divulgados no livro “O pensamento Jurisprudencial Brasileiro no Terceiro Milênio sobre Erro Médico”.
A pesquisa mostra que Minas Gerais tem 1.600 processos indenizatórios por erros médicos que estão em tramitação ou já foram julgados no período. O índice é um dos maiores do país, onde 7% dos médicos estão sendo ou já foram julgados. O Rio Grande do Sul lidera o ranking, com o dobro do número: 14% dos profissionais estão envolvidos em processos.
Os dados também apontam que a Ginecologia e Obstetrícia é a especialidade com maior carga processual em Minas. São cerca de 28% dos processos no Estado e 42% no Brasil. “A maior parte das negligências ocorre nos partos. Há muitos casos em que o obstetra retarda o procedimento, forçando o parto normal e, isto acaba virando um parto de emergência, que pode trazer consequências. Pode haver anóxia cerebral, onde falta oxigênio e o bebê sofre paralisia cerebral, podendo nascer paraplégico, tetraplégico, com deficiências neurológicas, surdo, mudo ou cego. Em algumas vezes, há casos até mesmo de morte”, explica Raul Canal. Outro ramo com muitas denúncias é o de cirurgia plástica. O especialista esclarece que o que ocorre nas plásticas, é que mais especialistas respondem pelos processos, mas o número de casos é inferior aos partos.
A pesquisa também mostra que a maioria das vítimas são mulheres (60% a 80%), enquanto os réus, aparecem, em maior número, entre os homens (70% dos médicos cometeram algum tipo de erro ou negligência). “Os médicos erram mais que as médicas. Negligenciam mais algumas regras de segurança”, esclarece Canal.
De acordo com o especialista, entre os danos que podem ser causados pelo erro médico, estão desde cicatrizes e pequenas lesões até sequelas graves, que podem resultar em quadros irreversíveis. “Por exemplo, a perda de um órgão, de uma função, cegueira, surdez, paraplegia, até o óbito. Uma gaze esquecida na cavidade do abdômen, por exemplo, mas pode causar uma infecção e levar a morte”, explica.
Como denunciar?
O advogado e presidente da Anadem aconselha aos pacientes vítimas de erros médicos que, primeiramente, encaminhem suas denúncias ao CRM. “Ele vai apurar se houve ou não negligência. Se houver, o Conselho irá ouvir o médico. Se ele for condenado no CRM, o paciente tem uma prova pré instituída para ir ao Judiciário”, esclarece, reforçando que a medida é simples e mais rápida do que levar o caso diretamente à Justiça.
Sobre a demora na resolução dos processos, Canal afirma que, nas esferas estaduais, eles costumam durar de cinco a oito anos. Nos casos em que é necessário o encaminhamento ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), o tempo varia de 10 a 12 anos. “98,7% dos casos são resolvidos dentro do próprio estado”, pondera.
Segundo Canal, os médicos condenados em processos judiciais estão sujeitos a multa e reclusão. Nos casos de indenização, eles estão sujeitos a pagar de R$5 mil até R$2 milhões ao paciente. E, perante o julgamento do CRM, que avalia a conduta ética e profissional, o médico negligente pode levar desde uma advertência em aviso reservado até a cassação do direito de exercício da Medicina.
Atenção dos médicos
Canal defende que os profissionais estejam mais atentos aos pacientes e realizem seu trabalho de forma humanizada. “É preciso olhar para o doente, e não só para a doença”, aconselha.
Ele acredita que a população está mais informada e quer participar do diagnóstico. Para ele, é preciso que os médicos considerem isto no momento do atendimento. “O paciente quer participar dinamicamente na compreensão de seus sintomas, no diagnóstico de sua doença, quer escolher as condutas terapêuticas baseadas nos custos, benefícios e riscos, em parceria com o médico. O médico tem que estar preparado para isso”, finaliza o advogado.(Fonte: Diário Regional)
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