segunda-feira, 7 de setembro de 2015

'Delirium', confusão mental em UTI, dobra risco de morte, diz estudo

Saiba mais sobre os sintomas, a prevenção e o tratamento da síndrome.
Problema atinge quase um terço de pacientes de UTI, segundo pesquisa.
 
'Delirium' é o estado de confusão mental que ocorre na UTI (Foto: H. Dres / BSIP)
'Delirium' é o estado de confusão mental que ocorre na UTI (Foto: H. Dres / BSIP)
 
 
Além disso, segundo o médico Jorge Salluh, pesquisador do IDOR e um dos autores do estudo, os dados mostram que a ocorrência de delirium está associada ao desenvolvimento de alterações cognitivas mais permanentes. “Muitos recuperaram as funções cognitivas em alguns meses. Houve outro grupo que, três anos depois, não tinha voltado ao estágio original. Para os que já têm alto risco para demência, a ocorrência de delirium pode acelerar o processo”, diz.
 
A pesquisa, que foi publicada pela revista British Medical Journal (BMJ) nesta semana, serve de alerta para a necessidade de as equipes de saúde se prepararem melhor para lidar com o problema, que tem medidas preventivas fáceis de serem aplicadas.
 
Família viveu drama de delirium não diagnosticado

 O problema acometeu o aposentado Washinton Augusto da Cruz em 2011, enquanto ele se recuperava de uma cirurgia grande de quadril na UTI de um hospital paulista. Para a família, foi um pesadelo, já que, segundo os parentes, a equipe de saúde não conseguiu diagnosticá-lo corretamente e não soube tomar as medidas mais adequadas.
 
Uma das filhas de Washinton, Catia Aguilhar, conta que o pai sempre teve um histórico saudável. Por causa de uma artrose no quadril, teve indicação cirúrgica. Quando acordou da anestesia, estava alterado. “Ele voltou da UTI totalmente agitado, inquieto, sem falar coisa com coisa. Tinha alucinações, interagia com coisas que só ele via, falava alto, ficou extremamente agitado. Às vezes, os enfermeiros o amarravam à cama”, conta.
 
“Em nenhum momento, nenhum dos profissionais que passaram para avaliá-lo sabia dizer o que ele tinha. Os enfermeiros diziam que nunca tinham visto isso na vida”, diz Catia. Outra filha de Washinton, Flávia Aguilhar, lembra que algumas enfermeiras questionavam se ele era alcoólatra. “Nós nos sentimos até mesmo ofendidas quando nos olhavam incrédulas, como se ele estivesse simplesmente tendo uma crise de abstinência de algum tipo de droga. Dizíamos para os enfermeiros que ele era muito tranquilo, e ninguém parecia acreditar.”
 
Diante da falta de informação no hospital, a família começou a procurar informações com amigos e na internet. Um médico conhecido foi quem alertou para a possibilidade de delirium, que era o que mais se aproximava do quadro. Os sintomas perduraram por cerca de cinco dias. Até que ele acordou sem os sintomas e sem se lembrar dos dias anteriores.
 
“Quando falávamos sobre delirium no hospital, a equipe médica e de enfermeiros parecia nem saber do que estávamos falando. Percebemos que há uma falta de informação absurda sobre este assunto, além do despreparo para tratamento”, diz Flávia.
 
Esse caso não é o único. Médicos intensivistas de grandes hospitais ouvidos pelo G1 dizem que, em muitas instituições, o problema não é levado em conta, apesar da simplicidade e do baixo custo das medidas perventivas e das possíveis sequelas permanentes que a síndrome pode deixar.
Veja, abaixo, perguntas e respostas sobre a síndrome:
 
Quais são os sintomas do delirium?
A médica Viviane Veiga, coordenadora da UTI Neurológica da Beneficência Portuguesa de São Paulo e UTI do Hospital São José, explica que o delirium caracteriza-se principalmente pela alteração dos níveis de consciência. Em alguns casos, o paciente fica agitado e agressivo: é o delírium hiperativo. Em outros momentos, pode ficar mais quieto: é o delirium hipoativo.
 
"O que acontece é que se a UTI não tem um olhar para essa condição, os casos são subdiagnosticados. Muitos hospitais acabam não sabendo", diz. Hoje existem questionários validados para se aplicar diariamente e identificar com mais facilidade os casos de delirium. 
 
Quais são as causas?

 Segundo Jorge Salluh, a ciência ainda não esclareceu completamente por que surgem esses sintomas. O que se sabe é que estar na UTI é um fator de risco importante para se desenvolver a síndrome.
Características geralmente vivenciadas em UTIs - como infecções graves, alterações agudas no funcionamento de órgãos, uso excessivo de certos sedativos - predispõem o indivíduo a ter delirium. Assim como outros órgãos podem apresentar falências, o delirium é como se fosse uma falência do cérebro.
 
É possível preveni-lo?

 O médico intensivista Carlos Eduardo Nassif Moreira, do Hospital 9 de Julho, diz que há medidas simples e de custo baixo que podem prevenir o surgimento de delirium.
Uma delas é reorientar o paciente, informando a todo momento a data, o horário e o local onde está. A presença mais constante de familiares também ajuda. Para os que tem deficiência visual ou auditiva, é importante devolver óculos e aparelho de audição assim que possível.
Há drogas que devem ser evitadas, pois comprovadamente induzem o delirium. Amarrar o paciente na cama também pode agravar o quadro. "O delirium é uma patologia cujo tratamento e prevenção é multidisciplinar, envolve a equipe toda no processo: médico, enfermeiro, fisioterapeuta e outros profissionais", diz Moreira.
 
Como é o tratamento?

 Segundo Salluh, não há tatamentos específicos para o delirium. O manejo da síndrome envolve medicamentos que podem controlar a agitação psicomotora e diminuir as alucinações. Além disso, tratar a causa inicial que levou o paciente à UTI é essencial.
 
Por que o problema é pouco conhecido?

 De acordo com Salluh, o conhecimento sobre o delirium é muito recente. Um dos motivos é que o uso excessivo de sedativo nas UTIs pode dificultar a observação dos sintomas de delirium. Só em 2001 foi criada uma metodologia específica para identificar casos da síndrome em UTIs.
 
Mariana Lenharo Do G1, em São Paulo
 
 
 
 

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