quarta-feira, 14 de abril de 2021

Em Manaus, cinco pacientes morrem depois de nebulização de cloroquina

 

Médica Michelle Chechter, que administrou a nebulização em maternidade, ficou conhecida após o ministro Onyx Lorenzoni divulgar o procedimento


O casal de médicos Michelle Chechter e Gustavo Maximiliano Dutra, ao lado do colega intensivista Tarcísio, em post no Instagram

Cinco pacientes morreram, incluindo um bebê prematuro, depois que a médica Michelle Chechter ministrou nebulização de cloroquina na maternidade Instituto da Mulher Dona Lindu, de Manaus. As informações são do jornal "Folha de São Paulo".

Para convencer as famílias, a médica ginecologista e obstetra paulistana Michelle Chechter disse que cloroquina tinha apoio do presidente Jair Bolsonaro. Ela atuou em Manaus com o marido, o também médico Gustavo Maximiliano Dutra.

Conforme reportagem do jornal, em meados de fevereiro, o auxiliar de produção Cleisson Oliveira da Silva, de 30 anos, cuidava do filho recém-nascido no Instituto da Mulher e Maternidade Dona Lindu (IMDL), hospital público estadual em Manaus. Na UTI, a esposa, Jucicleia de Sousa Lira, de 33 anos, lutava contra a COVID-19.

Para sua surpresa, Cleisson recebeu da irmã, que mora em Santarém, no Pará, por WhatsApp, um vídeo em que Jucicleia aparece sorridente durante uma sessão de nebulização de hidroxicloroquina. Foi assim que ele ficou sabendo que sua mulher recebia um tratamento experimental baseado em um medicamento ineficaz contra o novo coronavírus. 

Depois da nebulização, a saúde de Jucicleia só agravou e no dia 2 de março a técnica em radiologia morreu, 27 dias após o nascimento do filho único. O hospital informou à família que a causa foi infecção generalizada em decorrência da COVID-19. O viúvo disse à reportagem que, durante as conversas no hospital, Michelle Chechter não o consultou sobre a nebulização ou o vídeo.

A médica ficou conhecida depois que o ministro Onyx Lorenzoni compartilhou, no Twitter, vídeo onde ela administra nebulização com hidroxicloroquina.

OMS já concluiu que a hidroxicloroquina não funciona no tratamento contra a COVID-19

No vídeo, aparentemente gravado em 9 de fevereiro, Michelle Chechter induz a paciente a afirmar que a nebulização está funcionando. Em seguida, mostra o monitor da taxa de saturação oscilando entre 87% e 95%. "Vai respirando fundo", orienta a médica.

O "protocolo" adotado em Manaus foi criado pelo médico ucraniano-americano Vladimir Zelenko, que ganhou notoriedade em março de 2020, quando sua defesa do uso da cloroquina contra a COVID-19 foi abraçada pelo ex-presidente dos EUA Donald Trump. Mesma postura que ganharia espaço no Brasil.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) já concluiu que a hidroxicloroquina não funciona no tratamento contra a COVID-19 e alertou ainda que seu uso pode causar efeitos adversos graves, podendo levar à morte.

Esta prática de nebulização tem sido difundida no Brasil, inclusive com apoio de políticos e formadores de opinião. A  inalação de comprimidos de cloroquina macerados e diluídos em soro fisiológico é de alto risco e danosa ao já combalido sistema respiratório do paciente que enfrenta a COVID-19.

OUTROS CASOS

Em apuração da Folha de São Paulo, outros relatos afirmaram que  pelo menos outras três pacientes receberam nebulização mesmo sem terem autorizado. Todas morreram. Uma delas teria sido Ingrid Chaves, de 32 anos, que estava grávida de cinco meses.

Ela deu entrada no IMDL em 10 de fevereiro. Na manhã seguinte, Chechter ministrou hidroxicloroquina à paciente, segundo uma familiar que a acompanhava e conversou sob a condição do anonimato.

Nesse período, a médica entregou comprimidos nas mãos dessa familiar e a orientou a dar pessoalmente a hidroxicloroquina, sob a alegação de que outros médicos poderiam retirá-la do prontuário — procedimento ilegal no país, pois o medicamento de uma pessoa internada só pode ser fornecido pelo hospital.

Para convencer a família, Chechter disse que a hidroxicloroquina tinha o apoio do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e que, por causa disso, sofria oposição política.

MORTE NO RIO GRANDE DO SUL 


Em 24 de março deste ano, o Hospital Nossa Senhora Aparecida, de Camaquã, no Centro-Sul do Rio Grande do Sul, confirmou a morte de três pacientes com COVID-19 que foram nebulizados com uma solução de hidroxicloroquina. O procedimento foi administrado pela médica Eliane Scherer, denunciada pelo hospital ao Conselho Regional de Medicina e ao Ministério Público, que já investiga a conduta da médica.

No dia 19 de março, o presidente Jair Bolsonaro defendeu a atuação da médica Eliane Scherer durante entrevista a uma rádio do Rio Grande do Sul. "A doutora me disse e eu já tinha comprovado isso também. Ela falou, muito humildemente, que não é uma ideia dela a questão da nebulização. A primeira vez que ouviu falar foi lá no estado do Amazonas", afirmou o presidente na ocasião.

O tratamento experimental era administrado pela médica Eliane Scherer, que foi demitida da instituição. O hospital chegou a denunciar a profissional ao Cremers (Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul) e ao MP-RS (Ministério Público do Rio Grande do Sul) alegando 17 supostas infrações.



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