ONG critica o governo federal e afirma que 'a recusa em implementar ações coordenadas e efetivas contra a pandemia resulta em escalada de mortes evitáveis'.
Profissionais de saúde cuidam de pacientes com Covid-19 em hospital em Porto Alegre, em 11 de março, durante a pandemia do novo coronavírus
A ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) afirmou nesta quinta-feira (15) que o Brasil ainda não colocou em prática "uma resposta efetiva, centralizada e coordenada" para enfrentar o novo coronavírus, após mais de um ano do início da pandemia, o que está causando uma "catástrofe humanitária" e a morte de milhares de brasileiros.
Os Médicos Sem Fronteiras também criticam a politização das medidas de saúde pública, dizem que falta vontade política para reagir de maneira adequada à pandemia e fazem "um apelo urgente às autoridades brasileiras para que reconheçam a gravidade da crise".
O Brasil é o segundo país com mais mortes por Covid-19 do mundo (361 mil) e o terceiro com mais casos confirmados (13,6 milhões). Em seu comunicado, a ONG destaca que 11% de todos os casos e 26% de todas as mortes por Covid-19 registradas no mundo na semana passada ocorreram no Brasil.
"Estas cifras estarrecedoras são um indicativo claro da falta de habilidade das autoridades em lidar com a crise humanitária e de saúde que atinge o país e do seu fracasso em proteger os brasileiros, especialmente os mais vulneráveis, do vírus", afirma a MSF.
Os Médicos Sem Fronteiras são uma organização humanitária internacional que atuam em crises humanitárias. Criada em 1971 na França, a ONG recebeu o prêmio Nobel da Paz em 1991 e hoje tem mais de 45 mil profissionais atuando em mais de 70 países.
Na quarta-feira (14), um estudo publicado na revista científica Science apontou erros graves do governo brasileiro na resposta à pandemia. Segundo os pesquisadores, o fracasso do combate ao vírus foi uma combinação perigosa de inação e falhas, como o uso de tratamentos sem eficácia comprovada e a falta de coordenação nacional entre os diferentes níveis de governo.
“No Brasil, a resposta federal foi uma combinação perigosa de inação e erros, incluindo a promoção da cloroquina como tratamento, apesar da falta de evidências científicas”, dizem os pesquisadores no estudo.
Desinformação e fake news
Christos Christou, presidente internacional de MSF, afirma que "o governo federal praticamente se recusou a adotar diretrizes de saúde pública de alcance amplo e com base em evidências científicas", sobrecarregando as equipes médicas e colocando o sistema de saúde do país "à beira do colapso".
Para Christou, a consequência de transformar medidas de saúde pública em disputa política é que "ações de política pública com fundamento científico são vinculadas a posicionamentos políticos, em vez de estarem associadas à necessidade de proteger indivíduos".
Os Médicos Sem Fronteiras também alertam que "o grande volume de desinformação que circula pelas comunidades do país" alimenta o ciclo de doença e morte no Brasil. "Uso de máscaras, distanciamento físico e restrição de movimentos e de atividades não essenciais são rejeitados e politizados".
O comunicado também critica que "medicamentos como a hidroxicloroquina (usada geralmente contra malária) e ivermectina (um vermífugo) são apregoados por políticos como panaceia e receitados por alguns médicos".
Profissional de saúde descansa em UTI para pacientes com Covid-19 no Hospital das Clinicas de Porto Alegre em 19 de março de 2021
Vacinação 'aquém do desejável'
A ONG diz que "outro problema do Brasil é o ritmo da vacinação, aquém do que seria desejável". Em 2009, o país conseguiu vacinar 92 milhões de pessoas contra a gripe H1N1 em apenas três meses.
Até agora, cerca de 11% da população recebeu ao menos uma dose da vacina e menos de 4% tomaram a segunda dose.
"Isto significa que milhões de vidas no Brasil — e também além de suas fronteiras — estão em risco devido às mais de 90 variantes do vírus que estão atualmente em circulação no país, assim como novas variantes que podem surgir", afirma a MSF.
Mudança na resposta à pandemia
Meinie Nicolai, diretora-geral de MSF, afirma que "a resposta à Covid-19 no Brasil tem de começar na comunidade, não na UTI". "Testes rápidos de antígeno devem estar amplamente disponíveis para facilitar tanto a assistência aos pacientes como o controle da epidemia".
O ONG destacou que os leitos de UTI estão com ocupação acima de 90% em 19 das 27 capitais brasileiras e que há escassez de oxigênio e sedativos, essenciais para intubação de doentes em estado crítico, em hospitais de várias regiões.
"A falta de planejamento e coordenação entre as autoridades federais de saúde e suas contrapartes nos estados e municípios está tendo consequências de vida ou morte", afirma Pierre Van Heddegem, coordenador de emergência de MSF no Brasil.
Christou, presidente internacional de MSF, termina a nota da ONG afirma que "a recusa em colocar em prática medidas de saúde pública baseadas em evidências científicas resultou na morte prematura de muitas pessoas".
"A resposta à pandemia precisa urgentemente de um recomeço, baseado em conhecimentos científicos e bem coordenado, para evitar mais mortes desnecessárias e a destruição de um sistema de saúde conceituado e prestigiado", afirma o presidente internacional dos Médicos Sem Fronteiras.
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