quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Médica investigada por morte de paciente em Carazinho reconhece possibilidade de erro e assina acordo para não ser julgada

 

Caso completou dois anos em 28 de janeiro. Rosemar Leal da Silva, de 48 anos, fez cirurgia para retirar mioma no útero, mas teve o intestino perfurado. Família fala em 'injustiça'. Defesa de médica questiona perícia do corpo da vítima.


Rosemar Leal da Silva, de 48 anos, com o filho, Mateus

Uma médica investigada pela morte de uma paciente em Carazinho, no Norte do Rio Grande do Sul, firmou um acordo para não ser julgada pela Justiça. Para isso, Hanna Bidel Schwambach confessou a possibilidade de ter havido erro na cirurgia de Rosemar Leal da Silva, de 48 anos, e se comprometeu a prestar serviços comunitários no Hospital de Caridade, onde foi realizado o procedimento. O caso completou dois anos no dia 28 de janeiro.

O advogado Flávio de Lia Pires, que representa a médica, questiona a exumação do corpo, que teria sido realizada pelo marido da advogada da vítima.

"Ela [a médica] aceitou o acordo porque não teria como realizar um novo exame, já que o seu objeto [o corpo da vítima], pelo tempo decorrido, não possibilitaria uma nova perícia imparcial e isenta", diz.

Um dos filhos de Rosemar, Mateus Leal, fala em "sentimento de injustiça" com o acordo firmado pela médica com o Ministério Público e aceito pelo juiz. Conforme a investigação policial, a paciente realizaria uma cirurgia para retirar um mioma no útero, mas teve o intestino perfurado no procedimento e morreu em decorrência dissoVeja mais abaixo.

A advogada da família, Juliani Pinzon Pontes, afirma que o perito era o único de plantão quando a Justiça determinou a realização do exame.

"Houve uma nova perícia realizada pelo IGP [Instituto-Geral de Perícias], por outro profissional, de maneira indireta, onde, baseado no prontuário da paciente e fotografias do laudo de necropsia, confirmou a conclusão daquele laudo", afirma.

O resultado da análise do perito foi excluído dos autos do processo. A impossibilidade de realizar uma nova perícia, diz o defensor da médica, impediu a comprovação da versão da ré, de que não houve a ruptura do intestino da paciente.

O Hospital de Caridade de Carazinho diz que "não irá se manifestar, pois esse é um assunto que diz respeito somente à profissional médica".

Não persecução penal


A Lei 13.964 institui a possibilidade de assinatura de um acordo de não persecução penal. Essa medida é concedida a um investigado que tenha confessado a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a quatro anos. Nesses casos, o Ministério Público pode propor o acordo, "desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime", diz a lei.

A legislação prevê, ainda, que o acordo é assinado pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e por seu defensor. Um juiz decide se os termos propostos são aceitáveis e, após homologar, irá comunicar a vítima. Depois de cumprir o acordo, o investigado tem extinta sua punibilidade no caso.

O acordo foi homologado pelo juiz David Reise Gasparoni no dia 21 de setembro de 2022. A médica respondia a processo por homicídio culposo, quando não há a intenção de matar. Ela se comprometeu a pagar R$ 5 mil, divididos em quatro parcelas mensais, e a cumprir sete horas semanais de trabalhos comunitários por quatro meses.

"A vida dela valeu R$ 5 mil e algumas horas de trabalho", lamenta o filho da vítima.

O Ministério Público (MP) não quis comentar o caso, alegando que o processo está em segredo de justiça. O Conselho Regional de Medicina (Cremers) afirma que existe um processo interno em andamento, sob sigilo, apurando a atuação da médica.

'Revoltante'


Além do processo criminal, em que houve o acordo, a família move uma ação cível pedindo indenização por danos morais. Rosemar deixou marido, três filhos e não pôde conhecer o neto, que nasceu meses depois.

"A vida de uma mulher de 48 anos foi ceifada por um erro, por uma imprudência. É revoltante", diz o filho Mateus.

A família diz ter concordado com a conclusão do inquérito policial, que resultou no indiciamento da médica. No entanto, Mateus afirma que durante a mediação que possibilitou o acordo de não persecução penal, o MP não ouviu os parentes de Rosemar.

"A gente não chegou a ser mencionado pelo Ministério Público, não houve qualquer tipo de contato com a nossa parte. Só quando as nossas procuradoras tiveram acesso aos autos, tiveram conhecimento desse acordo", lamenta.

Segundo o MP, a Justiça ponderou que estava tudo conforme a lei.

"Dinheiro algum no mundo vai trazer o que era de mais importante, a presença da minha mãe conosco", afirma o filho.

Relembre o caso


Seis meses antes do caso, Rosemar já havia sido tratada pela médica para retirar um mioma no útero. Como não foi possível completar a retirada do tumor em apenas uma cirurgia, a mulher passou por um novo procedimento em 25 de janeiro de 2021.

Segundo a família, depois da cirurgia, Rosemar reclamava de dores e viu seu abdômen ficar inchado. Dias depois, a equipe médica percebeu que a paciente teve seu intestino perfurado, o que motivou o encaminhamento dela para a UTI.

A família suspeita que um erro médico tenha acontecido durante a cirurgia. Tanto o laudo médico quanto o atestado de óbito apontam que o intestino de Rosemar foi perfurado.

"A gente nem conseguiu mais ver ela falando", lembra Mateus.

Tanto o laudo médico quanto o atestado de óbito apontaram que o intestino de Rosemar foi perfurado. A Polícia Civil investigou o ocorrido, concluindo que houve homicídio culposo no caso.




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