Faleceu em 12 de abril de 1918, vitimado pela Sífilis, o jovem Ewerton Coelho, filho do Coronel Estevam Pereira Coelho, rico comerciante e venerável da Loja Maçônica Cotinguiba.
A família procurou vários médicos, no desespero, por uma doença de etiologia atribuída aos “conúbios pecaminosos”, desonrosa para os costumes da época.
O Dr. Augusto Leite prescreveu 12 injeções de Cianeto de Mercúrio.
O Dr. Helvécio Andrade entendeu que prescrição do mercúrio iria agravar a doença, pois além da sífilis, o paciente era portador de nefrite. Helvécio aconselhou a família que levasse Ewerton para Bahia, em busca de outros tratamentos mais modernos.
O Cianeto ou Cianureto de Mercúrio era um medicamento antigo, de elevada toxicidade. O mercúrio é um metal líquido, brilhante, branco azulado, sem cheiro nem sabor, muito pesado.
Durante 400 anos se usou mercúrio (azougue) contra a sífilis, de eficácia incerta, sempre acompanhado de efeitos adversos. A sífilis foi trazida para as Américas nas Naus de Cristóvão Colombo.
Em 1910, o cientista alemão Paul Ehrlich (Nobel em 1908), anunciou a descoberta da cura da sífilis com o Salvarsan, conhecido como o 606, um medicamento a base a arsênico.
Alarme falso, o Salvarsan (606) tinha eficácia apenas na sífilis primária. Um tratamento eficaz da sífilis precisou esperar pelo uso massivo da penicilina, pós Segunda Guerra.
Em 1918, já se sabia que a sífilis era causada pelo Treponema pallidum e se conhecia o Salvarsan. Entretanto, os tratamentos a base de mercúrio, ainda eram muito usados.
“O azougue (mercúrio) e compostos à base de sulfato de cobre, de sais de chumbo, triagas, panaceias, unguentos, elixires tiveram imoderada aplicação contra a sífilis.” Lycurgo Santos.
A verdade é que o jovem Ewerton não resistiu ao tratamento com o Cianeto de Mercúrio e foi a óbito. A suspeita de Helvécio Andrade se concretizou.
A família ficou indignada, lavrou em bronze no tumulo de Ewerton, um verso de Camões: “Mas debaixo o veneno vem coberto, segundo foi o engano descoberto, oh! Caso grande, estranho e não cuidado”.
O Dr. Augusto Leite entendeu como uma grave acusação de Erro Médico e responsabilizou o colega Helvécio Andrade pela iniciativa. O Dr. Helvécio negou que tenha imputado erro ao colega. A inciativa da inscrição no túmulo foi da família da vítima.
Mesmo assim, o Dr. Augusto Leite não seu por satisfeito. Em 09 de julho de 1919, um ano após o ocorrido, enfrentando um longo disse-me-disse, fofocas e falatórios em Aracaju, ele resolveu criar um “tribunal” na Biblioteca pública. Convidou os colegas médicos e o povo em geral, para realizarem o seu julgamento.
Disse Augusto Leite em nota pública: “Desejo ser julgado pelos médicos e pelo povo desta terra, onde se quer perpetuar no bronze o labéu de uma injúria.”
O julgamento foi realizado em 14 de julho, as 19 horas, com a presença do Governador do Estado, do Bispo Diocesano e da imensa maioria dos médicos que atuavam em Sergipe. Claro, o Dr. Augusto Leite foi absolvido pelo tribunal que ele montou.
No Julgamento, existiu um parecer do famoso clínico Clementino Fraga.
Entre os médicos sergipanos, só não compareceram ao julgamento, nem assinaram a nota de desagravo: Militão de Bragança, Enéas Ferreira, Samuel Dutra e Demétrio da Silveira.
O Dr. Augusto Leite ingressou na Justiça para exigir a retirada do verso de Camões do túmulo de Ewerton Coelho, que ele considerava injurioso a sua pessoa.
A Família se defendeu na justiça: “a inscrição não contém nenhuma imputação injuriosa, caluniosa ou pejorativa. Se existisse prova que a morte do nosso inditoso filho houvesse sido motivada por intoxicação mercurial, nós seriamos os primeiros a procurar os Tribunais para a reparação do mal.”
A Justiça não determinou a retirada do túmulo. Augusto Leite contrariado, transferiu a seu consultório para Recife, Pernambuco. Depois retornou, para dedicar a sua vida a medicina sergipana.
Augusto Leite é o fundador do Hospital de Cirurgia e da medicina cientifica em Sergipe.
Eu alcancei a polêmica inscrição, no Cemitério Santa Izabel, ao lado da Capela. Hoje, o tempo se encarregou de destruía-la. As letras caíram e o fato caiu no esquecimento da sociedade.
Antonio Samarone (médico sanitarista)
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