domingo, 4 de julho de 2021

Mulher denuncia caso de violência obstétrica no Hospital Universitário de Florianópolis

 Vítima relata ter sofrido indução do parto sem consentimento. Ela perdeu a bebê e não pode mais ter filhos devido a uma ruptura no útero



Raquel Afonso denunciou um episódio de violência obstétrica que afirma ter sofrido no Hospital Universitário de Florianópolis. Após mais de 12 horas na unidade hospitalar, a vítima relata ter tido o parto induzido sem o seu consentimento. Ela perdeu a bebê e não pode mais ter filhos devido a uma ruptura no útero. O caso aconteceu em agosto de 2020 e até o momento, ninguém foi responsabilizado.

“Eu não tive acolhimento, eu não tive monitoramento, eu não tive nenhuma assistência que aliviasse a minha dor ou que me explicasse o que era para eu fazer, o que tava acontecendo comigo, nada”, contou Raquel.

Mulher denunciou caso de violência obstétrica no Hospital Universitário de Florianópolis

No dia 26 de agosto do ano passado, a mulher procurou o Hospital Universitário de Florianópolis para uma consulta de monitoramento. Com 41 semanas de gestação e ainda sem trabalho de parto, tudo corria bem com a saúde dela e do bebê. Mesmo assim, Raquel foi internada e foi quando, segundo ela, começou uma sequência de episódios de violência obstétrica.

“Ele disse que ia colocar uma medicação para eu não sentir dor. Eu não entendi, mas ele não me explicou os riscos, não me explicou nada. Eu estava dentro do hospital, eu estava confiando neles. Quando colocaram a medicação, o trabalho de parto já começou muito forte, as contrações já começaram muito forte, começaram às 18h”, lembrou Raquel.

Os prontuários mostram a aplicação de ocitocina sintética, um medicamento usado para aumentar e acelerar as contrações. Conforme especialistas, o uso pode trazer riscos para a mãe e o bebê, principalmente em mulheres que já passaram por cesárea, como era o caso de Raquel. A recomendação é que, a partir das aplicações, o acompanhamento da gestante seja de meia em meia hora. Documentos fornecidos pelo hospital mostram que o intervalo entre uma visita e outra da equipe passou de três horas. Neste intervalo, a bolsa rompeu.

“Na hora que eu relaxei, que eu sentei, eu senti a bolsa estourar. Só que eu senti um chute aqui, senti uma dor muito forte, um estouro. Achei estranho. Quando eu gritei, a enfermeira entrou e eu falei para ela: ‘olha, aconteceu alguma coisa’”, disse Raquel.

Raquel sofreu uma ruptura no útero. Ela contou que nas visitas seguintes, médicos tiveram dificuldades para ouvir o coração da bebê. Já passava de meia noite quando ela foi para a sala de cirurgia, mais de doze horas desde a chegada no hospital e seis horas depois do início da indução do parto.

“Estava todo mundo nervoso na sala de cirurgia e eu sentia que eles tinham muita dificuldade para tirar ela. Eles mexiam muito a minha barriga, chacoalhava muito. Lembro que tiraram ela e a médica gritou. Quando eu acordei, a médica veio falar comigo. Bem na hora que eu acordei. Me perguntou se eu estava com dor, eu balancei a cabeça que sim e aí ela me disse assim: ‘olha você teve uma hemorragia muito grave. A gente teve que tirar o seu útero e a bebê não resistiu’”, relatou Raquel.

Raquel perdeu a bebê e não pode mais ter filhos devido a uma ruptura no útero

Uma reclamação foi protocolada na ouvidoria do Hospital Universitário. O MPF (Ministério Público Federal) apura o ocorrido em uma ação civil. Além disso, a Corregedoria do CRM-SC (Conselho Regional de Medicina do Estado de Santa Catarina) acompanha o caso em sigilo.

Para a advogada Luaralica Souto Maior, Raquel foi vítima de uma escalada de violências: “Infelizmente, Raquel sofreu a restrição de alimentação, a restrição de líquido, a restrição do acompanhante dela, que a gente tem uma legislação federal que garante que ela entrasse com o acompanhante dela. Ela sofreu maus tratos, xingamento, não foi bem assistida”.

O Hospital Universitário informou ser referência nacional em boas práticas de atenção ao parto e ao nascimento. Em nota, a instituição disse ter apurado o fato internamente e colaborado nas investigações. O caso também foi parar na polícia, com o registro do boletim por negligência médica.

O inquérito está sendo conduzido pela Delegacia de Proteção à Criança, ao Adolescente, à Mulher e ao Idoso da Capital. Além de documentos, prontuários e registros do atendimento no hospital, a investigação ouviu pelo menos oito funcionários entre enfermeiros e médicos em depoimento. De acordo com o delegado que assumiu o caso, o trabalho deve ser concluído ainda esta semana.

Para dar visibilidade ao caso, Raquel lançou o movimento ‘Justiça Por Melissa’, um manifesto cobrando o avanço das investigações, que já recebeu mais de cinco mil assinaturas.

“É difícil acompanhar as moças que estavam grávidas comigo com nenéns do mesmo tamanho. É difícil ter que ir no cemitério, ter que ver ela lá. Eu quero justiça. Eu quero que eles paguem pelo que fizeram. Porque do mesmo jeito que eu vou lembrar do que aconteceu, eles têm que lembrar do que eles fizeram. Não foi uma fatalidade. Eles causaram isso. Eu espero justiça”, desabafou Raquel.






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