quarta-feira, 13 de abril de 2022

Mães denunciam negligência no Hospital Infantil de Joinville; MP apura caso

 As mães denunciam demora no atendimento, falta de exames, descaso e desrespeito para com as crianças e os pais

Hospital Infantil

A movimentação intensa na emergência do Hospital Infantil Dr. Jesser Amarante Faria, em JoinvilleNorte de Santa Catarina, tem deixado famílias apreensivas. Alguns pais denunciam demora, mau atendimento e até negligência na unidade de saúde.

O primeiro caso é da moradora de Araquari Patrícia de Moura Oliveira, que precisou de atendimento para a filha de 9 meses e a levou até o Hospital Infantil.

O drama começou no início do mês de março, quando a menina foi internada na instituição com bronquiolite. Foi liberada e, segundo a mãe, começou a apresentar problemas na respiração.

No dia 28 de março, a família teve de retornar ao Hospital Infantil. Ela conta que a filha estava com

mais de 40 graus de febre e saturação de oxigênio baixa, se esforçando para respirar. Na chegada, entre fazer a ficha de atendimento e passar pela triagem, o tempo de espera foi de duas horas, relatou Patrícia. No consultório, o médico teria dito que a criança estava com ataque cardíaco.

Para baixar a febre, a criança teria que estar com saturação boa.  Pediu então que fosse com urgência para a sala de medicação para fazer o tratamento com a bombinha.

“Chegando lá, não tinha como passar. Um enfermeiro saiu já falando que tinha que esperar. Tentei argumentar o que o médico tinha me falado, mas o profissional falou que eu não era melhor que ninguém, todo mundo estava esperando e eu também teria que esperar”, relembra Patrícia.

A mãe, então, entrou em crise de choro e desespero, foi na sala do enfermeiro geral para implorar por uma bombinha para a filha. Daí, teve a súplica atendida. Às 19 horas, ocorreu a troca de plantão e a médica liberou a criança para ir para casa “mesmo estando com febre e saturando baixo”, relembra o que passou.

Ainda segundo a mãe, a médica teria informado que nos exames não havia aparecido nada e o tratamento poderia continuar em casa, sem precisar ficar internada. Naquela noite, a criança teve muita falta de ar e não conseguiu dormir.

Já no dia 29 de março, os pais levaram a criança para o Hospital e Maternidade Nossa Senhora das Graças, em São Francisco do Sul, Norte de Santa Catarina, onde ela passou por exames e foi constatado que estava com 80% dos pulmões comprometidos e ainda com “pontada de pneumonia dupla.”

A menina foi internada às pressas, ficando em São Francisco do Sul até dia 31 de março. Após essa data, foi transferida para o Hospital Infantil em Joinville, pois precisava de uma UTI (Unidade de Tratamento Intensivo).

Chegando no Infantil, a mãe relatou que “não fizeram nada” e a criança seguiu para um quarto normal. De sexta-feira, dia 1/4, para sábado, dia 2/4, a criança continuou com falta de ar, segundo Patrícia, e “mais uma vez ninguém fez nada.”

“Chamava a enfermagem e nada. No sábado pela manhã, o médico passou e falou que que minha filha já deveria estar na UTI, desde a madrugada de sexta.”

A criança, então, foi levada para a UTI e, segundo a mãe, continuava com dificuldade imensa para respirar. “Cortaram toda a medicação. Eu já estava desesperada, sem saber o que fazer.”

Na segunda-feira, dia 4, a menina ganhou alta da UTI e foi para o quarto. Ela segue internada na unidade de saúde.

Outra denúncia que Patrícia fez é quanto à dosagem do medicamento Dipropionato de Beclometasona de 50mg (utilizado para problemas respiratórios). Segundo a mãe, a dosagem prescrita seria de 50mg e a dosagem que a criança estava recebendo era de 250mg. A mãe questionou o enfermeiro. “Eles falaram que a prescrição estava errada e na UTI a dosagem era de 250mg mesmo”, comentou Patrícia.

Idas e vindas até diagnóstico de pneumonia


A segunda denúncia envolvendo o Hospital Infantil partiu de Eloisa Anacleto, tia de uma menina de 11 meses. Ela se diz triste ao constatar a falha no cuidado com a saúde das crianças.

A sobrinha de 11 meses passou duas semanas entre idas e vindas do Hospital Infantil com febre de 40 graus, tendo como diagnóstico dado pelos médicos sendo resfriado.

“Receitaram somente medicação para baixar a febre e mandaram voltar para casa sem nem mesmo fazer exame”, critica Eloisa.

No dia 2 de abril foi liberado o plano de saúde da sobrinha. Então, a mãe da criança a levou em um hospital privado de Joinville, onde imediatamente fizeram exames de sangue e raio x, onde foi diagnosticada uma infecção grave no pulmão. “Imediatamente a criança tomou medicamentos.”

Devido à fragilidade da bebê, o hospital solicitou internação e foi negado devido ao período de carência. Dessa forma, o hospital privado solicitou  transferência da criança para o Hospital Infantil, onde foi levada no fim da tarde.

Chegando lá, por volta das 18 horas, a mãe teria sido informada que não havia leito disponível para internação e que precisava esperar passar pelo médico para ver se teria a necessidade da internação.

“Umas três horas depois, ela foi encaminhada para exames onde foi constatada pneumonia. A mãe da menina questionou a enfermeira sobre dar continuidade na medicação que a bebê estava fazendo no hospital privado, tendo como resposta que o médico ainda não havia receitado nada.”

A tia Eloisa ficou muito indignada com o tratamento que a sobrinha estava tendo. Ela chegou a fazer uma postagem nas redes sociais relatando o ocorrido. Repercutiu rápido chegando até o coordenador do Hospital Infantil.

Já no dia 3 de abril, perto do meio-dia, a mãe da criança ligou para Eloisa contando que um homem no hospital foi falar com ela se apresentando como coordenador do hospital. Ele teria sido grosseiro e teria perguntado na frente de outras mães o porquê da postagem na rede social. Ele teria dito, ainda, que a criança estava bem e que não era nada grave.

Duas horas depois, a criança começou a saturar baixo e precisou de oxigênio, segundo a tia.

Diante da postagem na rede social, outras mães também relataram que estavam enfrentando o mesmo problema com o hospital. No mesmo dia, perto das 22 horas, a criança, felizmente, conseguiu uma vaga para internação.

Reclamação feita por Eloisa em uma rede social

Eloisa protocolou uma denúncia ao Ministério Público por negligência. Na denúncia, alegou, entre outras coisas, falta de exames, descaso e desrespeito para com as crianças e as mães. Um boletim de ocorrência foi registrado também na Polícia Civil.

Um inquérito foi instaurado pelo Ministério Público para apurar as denúncias

Reprodução documento

“Que o hospital está superlotado entendemos, mas o que não podemos admitir é voltar para casa sem nenhum exame, nenhum diagnóstico concreto, não podemos ser tratados com desrespeito. A saúde pública é um direito social e dever do Estado. Inúmeras são suas responsabilidades para com a população que merece o mínimo de respeito e dignidade”, concluiu Eloisa.

Ministério Público apura caso


A reportagem do Portal ND+ entrou em contato com o Ministério Público de Joinville, que informou que em todos os casos de denúncia ao órgão é feita uma análise inicial e encaminhada para a promotoria responsável.

No caso específico do Hospital Infantil, a ouvidoria já encaminhou a manifestação à 15ª Promotoria de Justiça de Joinville. O promotor de Justiça, Felipe Schmidt, determinou a instauração de notícia de fato para apuração da matéria.

Depois de notificado, o Hospital Infantil terá cinco dias para apresentar uma justificativa mediante a gravidade do caso apresentado (infecção grave no pulmão de criança de tenra idade).

A situação da lotação nas UTIs Neonatais em todo o estado de Santa Catarina, já está sendo apurada pela Promotoria de Justiça da Capital, visto que a saúde da criança é um direito a ser garantido pelo estado.

Na semana passada o índice de ocupação em todo o estado era de 98,53%. O promotor Sandro Ricardo de Souza, solicitou informações sobre a falta de leitos.

Segundo ele, a 10.ª Promotoria de Justiça da Capital instaurou um inquérito civil, visando apurar a elevada taxa de ocupação de UTI Neonatal do estado. Como medida inicial foram solicitadas informações da Secretaria de Estado da Saúde, para dizerem a respeito da ocupação dos leitos de UTI nas diversas regiões do Estado, assim como quais medidas estão sendo adotadas para garantir o efetivo atendimento das crianças que dependem desse serviço.

“A par de todo atendimento ou qualquer investigação que venha se desenvolver nas promotorias de justiça do Estado, aqui se instaurou o inquérito civil, objeto um pouco mais amplo para haver um diagnóstico mais preciso de todo o problema e se busque soluções satisfatórias para garantir o atendimento de crianças nos em leitos de UTI neonatal”, concluiu o promotor.

O que diz o Hospital Infantil


Procurado, o Hospital Infantil de Joinville, disse que o volume de atendimento no Pronto-Socorro da instituição historicamente sempre foi elevado e próximo da capacidade instalada.

Veja abaixo a nota na íntegra:


“O Hospital Infantil Dr. Jeser Amarante Faria, através da sua Assessoria de Imprensa, vem por meio desta nota esclarecer a comunidade sobre o tempo de espera elevado no Pronto-Socorro. O volume de atendimento no Pronto-Socorro da instituição historicamente sempre foi elevado e próximo da capacidade instalada, com demandas de todos os níveis e graus de criticidade, atendendo a macrorregião de mais de 1,4 milhões de habitantes, ainda sendo referência estadual para determinadas patologias.

Ademais, muitas vezes configurando como a única porta de acesso para atendimento pediátrico do município para demandas não urgentes e de baixa complexidade. Nos últimos meses, a instituição vem trabalhando com sua capacidade máxima de atendimento. A situação vem se agravando desde dezembro de 2021 pela falta de pediatras em outras unidades de atendimento na cidade e região.

Neste período obtivemos um aumento de 30% no número de atendimentos diários no Pronto-Socorro, sendo que 65% do número global de atendimentos são de casos poucos urgentes e/ou de baixa complexidade que poderiam ser compartilhados com outras portas de atendimento até mesmo ambulatoriais do município. O atendimento no Pronto-Socorro acontece seguindo o Protocolo Manchester, em que os pacientes são classificados de acordo com sua condição clínica, e os casos de urgência e emergência sempre serão prioritários.

A instituição sempre esteve com a sua escala de atendimento completa e conta com 6 médicos, sendo 3 médicos pediatras, 1 médico residente, 1 cirurgião pediatra e 1 ortopedista, que atuam exclusivamente no Pronto-Socorro em escala de 24 horas. Hoje, todos os nossos setores de atendimento estão superlotados e a estrutura física não permite ampliação. Em janeiro de 2021 foram realizados 4800 atendimentos e no mesmo período de 2022 foram 8215.

No mês de março, o número já está próximo dos 8 mil atendimentos somente no Pronto-Socorro. Reforçamos que buscamos diariamente manter nosso atendimento de excelência e compromisso com a comunidade e pedimos a atenção dos pais e responsáveis para que neste momento verifiquem também a disponibilidade de atendimento pediátrico em outras unidades de atendimento da sua região para os casos não urgentes ou de baixa complexidade. Frisamos a importância de outras portas de acesso às estas demandas pediátricas não urgentes e ambulatoriais que precisam ser garantidos pelo município de forma perene e dimensionada.”

Sobre a acusação do coordenador do Infantil, por ter agido de forma grosseira com uma das mães, o hospital disse que não iria se manifestar.

O que diz a prefeitura de Joinville:


O secretário de Saúde de Joinville, Jean Rodrigues, disse que nos últimos 30 dias houve um aumento na procura de crianças nos pontos de urgência e emergência, não só do Hospital Infantil, mas da UPA Leste também.

“Esse é um grande desafio que temos encontrado neste período de transição climática e, também a plena volta das crianças a todas as aulas. Isso é um desafio que acontece todos os anos. E nesse momento estamos com dificuldades de médicos nas unidades básicas e isso está ocasionando a sobrecarga nos pontos de urgência e emergência da cidade.”

O secretário frisou ainda que se os pais precisarem de atendimento para os filhos, o local para serem levadas é nas Unidades Básicas de Saúde. Um dos motivos para essa grande procura seria os casos de virose nas crianças.

Segundo Jean Rodrigues, a secretaria da saúde de Joinville continua fazendo a contratação de médicos pediatras. E também foram chamados 86 profissionais para trabalhar nas Unidades Básicas de Saúde.

“Desses 86, nove já estão atuando na saúde da cidade. A entrada desse profissional deve estar normalizada em até 60 dias”, afirmou o secretário.

Atualização do estado de saúde das crianças:


As duas meninas, de 9 e 11 meses, ganharam alta e estão em casa.







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