segunda-feira, 7 de agosto de 2017

“Na maioria das vezes, paciente ou familiar não fica sabendo”

ERRO MÉDICO. Bruna Hernandes diz que mais pessoas buscam reparação, mas desconhecimento ainda atrapalha
 
Bruna Hernandes é pós graduanda em direito médico da Saúde, membro efetivo da comissão do Jovem Advogado e coordenadora do Projeto OAB vai à FaculdadeFoto: Paolo Perillo/DL
 
A frase é da pós graduanda em direito médico da Saúde, membro efetivo da comissão do Jovem Advogado e coordenadora do Projeto OAB vai à Faculdade, Bruna Hernandes. Apesar o desconhecimento técnico da maioria da população, ela afirma que cresce o número de pessoas que estão buscando a reparação na Justiça. Confira:
 
Diário do Litoral – Não era muito comum a busca por reparação até porque, geralmente, o paciente e seus familiares estão fragilizados e acreditam que o desgaste só aumentaria o sofrimento. Isso é verdade?

Bruna Hernandes –
Também. O que ocorre é que, na maioria das vezes, o paciente ou o familiar nem fica sabendo que houve algum tipo de erro médico porque os procedimentos são muito técnicos. Só quando a situação é muito gritante, muito evidente, é que a pessoa percebe de imediato e sai à procura de seus direitos.
 
Diário – Um exemplo mais gritante é quando é encontrada uma ferramenta dentro do corpo do paciente?

 Bruna –
  Ou quando morre por uma outra situação que não a que o levou à cirurgia. O profissional pode ser processado civil ou criminalmente e perder o registro.
 
Diário – Tem que agir com rapidez? Tem prazo?

 Bruna –
Tem familiares que percebem logo e já correm atrás. Mas também há casos que, por acreditar que se trata de poder público ou classe médica, fica difícil ganhar a ação e, então, não ingressa. Tem pessoas que chegam a procurar o advogado e depois desistem. O prazo prescricional é de cinco anos.
 
Diário – Há casos de negligência já no primeiro atendimento, no balcão? E isso também cabe ação?

 Bruna –
A negativa de cobertura de planos de saúde são exemplos, de negação no balcão também. São inícios de procedimentos. As consequências deles também. Há casos de imprudência, negligência e imperícia. É preciso identificar se houve cada um deles.

 É preciso obter uma perícia médica, feita por um profissional de saúde (médico). Houve um caso em um hospital aqui da região em que a mãe, após ter seu bebê, percebeu que o braço da criança estava quebrado. Na hora de engessar, os médicos fizeram o procedimento, só que no que estava bom. Nesse caso, nem precisou de perícia técnica. Há outro caso que houve um erro de diagnóstico. A paciente entrou para fazer um tratamento de hemodiálise e acabou falecendo por parada cardíaca.
 
Diário – Há médicos que auxiliam advogados a detectar falhas?

 Bruna –
O Poder Judiciário possui vários peritos para avaliar as situações. Mas a pessoa pode contratar um particular.
 
Diário - Há números?

 Bruna –
Não, mas existe um evidente crescimento na procura dos direitos tanto por paciente, como por familiares, principalmente contra convênios, que estão negando coberturas de atendimento, mesmo sendo urgência e emergência, mesmo após o término da carência.
 
Diário – É  o valor?

 Bruna –
Sim, eles fazem conta. Recentemente, um plano se negou autorizar uma radioterapia e a família custeou o tratamento. O paciente acabou falecendo. Os familiares entraram na Justiça para rever o valor, pedir danos morais e acabaram vencendo.
 
Diário – Há muitos erros quando o atendimento é de urgência e emergência?

 Bruna –
  Em Guarujá, um rapaz sofreu um acidente de trânsito e quebrou o braço. Ele foi atendido pelo SAMU, encaminhado à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e depois para o hospital. O médico que atendeu diagnosticou fratura e a necessidade de uma cirurgia. Mas, segundo ele, disse que teria que procurar o hospital da cidade que ele residia. Ele foi para São Vicente e o hospital estava em greve. Depois, para Praia Grande e recebeu a mesma recomendação. Enfim, a cirurgia só foi realizada 20 dias depois. Ele devia ter sido atendido em Guarujá.
 
Diário – Também há negativa de medicamentos e exames?

 Bruna –
Sim, principalmente os de alto custo. Isso também cabe ação.
 
Diário – São comuns também erros de diagnóstico?

 Bruna –
Uma mulher que tinha um histórico de anemia deu entrada em um hospital e, após ser tratada, começou a sentir dores abdominais. O primeiro médico havia desconfiado de apêndice e pediu exames. Entre os exames e a próxima consulta, ela resolveu mudar de médico que sequer a tocou. Olhou os exames e disse que era apenas uma dor abdominal, prescrevendo uma medicação. As dores ficaram insuportáveis e, depois de três dias, um terceiro médico a colocou em uma mesa de cirurgia porque ela estava morrendo de apendicite. Era para fazer dois furinhos e ele teve toda a barriga aberta para lavagem dos órgãos e posterior cura.
 
Diário – O poder público pode ser responsabilizado pelo sucateamento do SAMU?

 Bruna –
Se conseguir comprovar que a situação prejudicou a assistência, sim.  
                
Diário – O que o paciente prejudicado ou que possa ser deve fazer?

 Bruna –
Procurar um advogado de confiança, levantar toda a documentação possível, prontuário médico, entrada e saída do hospital, enfim, tudo que é necessário para garantir o direito por intermédio de uma liminar judicial. O juiz vai analisar argumentos e documentos. Também é importante registrar um boletim de ocorrência. A Polícia é obrigada a fazer. Para se ter uma ideia, tem hospital que está se negando a passar o prontuário médico do paciente. Um absurdo!
 
Diário - Os médicos estão mais preocupados?

 Bruna –
Estão até contratando seguros específicos para ações indenizatórias. Mas é bom que fique claro que não são apenas médicos, mas todos os profissionais da área da saúde e instituições têm responsabilidades Tem que levar em consideração a carga excessiva de trabalho e a má remuneração dos profissionais. Um médico, as vezes, comete um erro por desgaste físico. Isso ocorre na área pública e privada.
 
Diário – Também existe aventureiros?

 Bruna –
Sim, tem pessoas que querem que tudo vire processo com objetivo de levantar dinheiro. Eu já recebi no escritório um paciente inconformado e depois, consultando um médico que me auxilia, detectei que não houve erro algum. O médico havia seguido todos os protocolos e não teve culpa pela morte da pessoa.  
 

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