Em Cuiabá, 5 mil pessoas vivem com HIV/Aids. São de várias classes sociais e fazem tratamento em sua maioria no SAE. No destaque, alguns anti-retroviral |
Já há uma década um portador do vírus da Aids, de 37 anos, procura o Serviço de Atendimento Especializado (SAE), na Capital, para buscar anti-retroviral. Faz isso duas semanas antes do estoque acabar. Tomar o medicamento em dia é essencial no controle da síndrome, enfrentada por ele e 40 milhões de pessoas no mundo, 5 mil só em Cuiabá. Acontece que, segundo diz, a farmácia tem ficado em muitos dias fechada. O paciente vai buscar o remédio e volta para casa de mãos vazias.
Para lembrar que acesso à saúde é lei, a nota cita a Constituição Federal. No entanto, na rotina, a realidade seria outra. "Falta atendente, assistente social, cardiologista e farmacêutico, profissionais importantes no sucesso do tratamento". Cita ainda que é precário o prédio do SAE, "com buracos, portas que não fecham, banheiros sem espelhos, descargas que não funcionam, nunca tem copo para beber água, o teto está caindo e faz calor insuportável".
Farmácia do SAE fechada, outra vez, nesta quarta |
"A atenção secundária está nos matando, aos poucos, tirando um profissional daqui, outro dali, falta leite para os bebês das mães soropositivos, falta também até a dignidade, que há muitos anos não vejo por ali", lamenta o paciente de 37 anos, cujo nome é mantido em sigilo, porque a Aids ainda motiva discriminação e preconceito. "Nunca vi o SAE assim, está na sua pior fase, tanto de recursos humanos quanto físicos".
Ele contraiu Aids na primeira relação sexual da vida sem preservativo, com o namorado. Quando pegou o resultado, não acreditou, mas refez e confirmou o diagnóstico. Resolveu contar a todos da família em um jantar. Por sorte, é bem aceito, o que não é tão comum. "São pessoas maravilhosas, me aceitam como gay, HIV positivo".
Seguindo o tratamento à risca, está bem se saúde, malha, trabalha, namora.
Na segunda (29), foi ao SAE buscar medicamento mais uma vez, mas a porta estava fechada. "Eu e outros voltamos para trás sem nada".
Ele também reclama que o SAE, segundo diz, precisa se atualizar. "Ate hoje nosso prontuário não é digitalizado, usamos pasta com informações sobre nosso tratamento, endereço, telefone para contato".
Todos suscetíveis
Uma mulher, de 52 anos, HIV positivo, também tem sentido este problema, reclama da demora, de descaso. Ela foi infectada, em uma relação estável, hétero, ou seja, com um homem, em 2016 e toma medicamento há 2 anos e 7 meses. "Não temos disponibilidade de passoar o dia todo na fila, quase todos nós trabalhamos. Não temos nem cadeiras, nem para esperar consultas ou a entrega de remédios, o SAE está sucateado", critica.
Ela, que toma cinco comprimidos por dia, ressalta que a Aids não escolhe alvo. "Sou funcionária pública federal, bissexual, branca, com nível superior completo e faço essa observação para deixar bem caracterizado que o HIV não escolhe cor, raça, credo, orientação sexual, nível socioeconômico cultural e todos nós estamos passíveis de sermos infectados".
Segundo ela, aderir ao tratamento e se manter bem vai além de tomar o medicamento, precisa também se alimentar de forma saudável e cuidar da saúde mental, porque o estigma ainda é muito forte. "Começa a discriminação na família e é difícil lidar com o processo de infecção, daí a necessidade de termos assistente social e psicóloga que possa nos dar suporte e orientação", diz.
Bagunça
Um cabeleiro de 25 anos se deparou com o resultado de exame da Aids positivo este ano. "Andei passando muito mal no mês de março. Fui ao SAE, fiz o exame e deu negativo, mas fiz novamente e deu positivo", detalha. Resume que contraiu Aids "usando material de outra pessoa". Sobre o SAE, vê descaso. "É uma falta de informação, os funcionários te atendem de qualquer jeito, tem médico que marca consulta para 7h da manhã e só vai atender o paciente ao meio dia, que falta de cuidado! Uma bagunça total".
Nesta quinta (1) ele foi à farmácia pegar medicamento, que está tomando há 4 meses, e encontrou a porta mais uma vez fechada.
Outro lado
O entrou em contrato com a Assessoria de Imprensa da Saúde de Cuiabá, que ficou de encaminhar uma posição sobre a denúncia. De antemão, disse que a reclamação do coletivo Amigos Positivos não procede e, para rebatê-lo, emitiu uma outra nota, que chegou no início desta tarde.
Confira a íntegra da nota da Secretaria
A respeito das denúncias veiculadas sobre o SAE a Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá (SMS) esclarece que:
As informações veiculas não procedem. A unidade atua com três farmacêuticos o suficiente para suprir a demanda da unidade.
Com relação a insumos e medicamentos. Não há falta de nenhum deles e todos os pacientes estão recebendo regularmente.
Sobre a redução no quadro funcional o quadro será restabelecido tão logo seja finalizado o processo seletivo da SMS que já está em andamento.
Sobre a estrutura física, a unidade, a exemplo de muitas outras que foram herdadas pela atual gestão não recebia reformas há décadas.
Todavia, na contramão do que está sendo veiculado, o projeto de ampliação assistencial do SAE passará no Conselho Municipal de Saúde no próximo dia 06/08.
Confira também a nota dos pacientes
Soropositivos estão tendo a morte civil anunciada.
A demora no atendimento, serviços sobrecarregados, falta de pessoal, a carência de insumos, fatores que estão desencorajando e levando a morte civil de milhares de pessoas vivendo com HIV/AIDS em Cuiabá, afinal como ter uma vida digna se não temos o direito a saúde?
A saúde é direito de todos e dever do estado, garante a constituição Federal de 1988, artigo 196, contudo o que presenciamos todos os dias é a desativação e morte lenta do SAE/CBA seja pela falta de um atendente, Assistente Social, Cardiologista ou devido a ausência do Farmacêutico, profissional importante no sucesso do tratamento, ressaltamos ainda a mudança quase que mensal deste profissional, contudo lembramos que muitos pacientes criam laços de fraternidade, amizade com este proffional, trocando informações e contribuindo para o sucesso do tratamento, o Direito à Saúde não pode ser apenas ao tratamento repressivo aos medicamentos, é muito mais amplo e está relacionada ao acolhimento, a humanização e as vezes até um sorriso.
O prédio físico, tem buracos, portas que não fecham, banheiros sem espelhos, descargas que não funcionam, nunca tem copo para beber água, o teto caindo, um calor insuportável, existe recursos da atenção secundária para ter esses profissionais, o que existe é um desmonte explicitamente e claramente do SAE.
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