domingo, 26 de junho de 2022

Ministério Público apura casos de violência obstétrica no hospital de Caçapava do Sul

 

Sala de cirurgia do Hospital de Caridade Dr. Victor Lang, em Caçapava do Sul. Foto: Marcelo Marques

Casos de violência obstétrica no Hospital de Caridade Dr. Victor Lang, em Caçapava do Sul, estão sendo apurados pelo Ministério Público (MP). Os casos vieram à tona a partir de relatos feitos por mulheres em um grupo de WhatsApp que tinha como objetivo a troca de experiências sobre maternidade.

A partir disso, foi criado o Coletivo Mães de Caçapava, que já recebeu, via formulário eletrônico, 85 relatos de violências sofridas no parto, entre elas agressões verbais, privação de alimentação e hidratação, impedimento da entrada de acompanhante na sala de parto – um direito garantido por lei –, manobra de Kristeller – que consiste em empurrar a barriga da mãe no momento do parto para estimular o nascimento do bebê –, episiotomia – corte feito no períneo sem consentimento durante o parto –, uso de fórceps e até fratura no fêmur de um bebê durante o parto. Aos menos seis casos chegaram ao MP nos últimos meses. As situações, conforme relatos, são pontuais e relativas a apenas alguns profissionais.

O promotor público Gabriel Capelani confirma que, das seis comunicações de mães feitas ao MP, uma foi arquivada por falta de elementos que comprovassem a violência. De acordo com ele, são situações que podem caracterizar uma falta de humanização no cuidado obstétrico e neonatal na rede de saúde local.

– As denúncias foram reunidas e decidimos instaurar um procedimento administrativo para acompanhar e fiscalizar de forma continuada e permanente o andamento das políticas públicas que garantem a humanização e qualificação no cuidado obstétrico e neonatal. Com isso, a gente busca verificar os procedimentos adotados atualmente e qualificá-los – explica.

O promotor afirma que encaminhou cópias dos relatos ao Conselho Regional de Medicina (Cremers) e ao Conselho Regional de Enfermagem (Coren-RS). Conforme Capelani, o processo está em fase de apuração e não foi necessário o afastamento de nenhum profissional.  

De acordo com o Conselho de Medicina, toda tramitação, desde denúncia, sindicância e processos são sigilosos e o conselho não pode passar informações sobre os casos. O Conselho de Enfermagem afirma que acolheu as informações do MP e tomará as devidas medidas no seu âmbito de atuação.  

Falta de respostas


Uma das líderes do coletivo é a massoterapeuta Raísa Borba Nunes, 30 anos, que atende gestantes no município. Ela conta que muitas mulheres, por conta da fragilidade e do medo, acabam não fazendo denúncias formais às instituições. O grupo entregou uma carta aberta ao hospital em 15 de março, porém, segundo Raísa, até agora não teve retorno da instituição.

– No outro dia (da entrega da carta) tivemos uma reunião com a comissão de saúde da Câmara de Vereadores. A representante do hospital apenas negou que isso acontecesse. Ela chamou os vereadores ao hospital e mostrou uma estrutura que até pode existir, porém não funciona efetivamente – afirma a massoterapeuta.

O hospital


Hospital de Caridade Dr. Victor Lang, em Caçapava do Sul.

O presidente do Hospital de Caridade Dr. Victor Lang, Florenço Monego Junior, garante que recebeu apenas uma notificação do Ministério Público, que já foi arquivada. Por e-mail, ele disse que repudia por inteiro as imputações sobre “agressões verbais” e “privação de alimentação e hidratação”.

Sobre restrições de acompanhantes na sala de parto, ele explica que em razão da pandemia houve a adoção de uma série de medidas administrativas de circulação de pessoas e acompanhantes a pacientes no hospital, sempre respeitando os desejos dos atendidos, em especial as gestantes. Ainda sobre os procedimentos, como a manobra de Kristeller e a episiotomia, segundo o diretor, seguem as normativas do Conselho Federal de Medicina, constituindo-se em ato médico.

Ainda segundo o presidente, o Hospital de Caridade Dr. Victor Lang é uma das poucas instituições hospitalares do Estado que realizou a adequação da maternidade às normas vigentes para adesão ao Programa de Parto Humanizado do Sistema Único de Saúde (SUS). Conforme ele, foram realizadas obras na área física e aquisição de equipamentos específicos para isto.

Sobre a capacitação dos colaboradores e os desejos das mães, o hospital destaca que são feitos “frequentes cursos de atualização e capacitação, tudo devidamente fiscalizado pela Secretaria Estadual de Saúde. Nem sempre todos os ‘desejos’ estão ao alcance humano de serem atendidos, muitas vezes, diante do próprio desconhecimento das gestantes a respeito da realidade de um parto e dos impactos físicos que o ato traz consigo, assim como dos expedientes médicos e hospitalares necessários para o êxito do nascimento de uma criança, mesmo que de forma natural”.

Por fim, a direção esclarece que, em maio deste ano, foi feito um trabalho de avaliação com as pacientes atendidas na maternidade. Segundo o presidente, a pesquisa foi realizada por meio de questionário, preenchido voluntariamente pelas pacientes, revelando “números bastante significativos sobre a qualidade do serviço prestado”. Os resultados, de acordo com Monego, serão utilizados para a qualificação do serviço prestado.





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