quinta-feira, 7 de maio de 2020

Após BO por falta de médico, Justiça obriga Rio a repor equipe em hospital

5.mai.2020 - Corpos são retirados por carro funerário em UPA ao lado do
Hospital Lourenço Jorge, na zona oeste do Rio

A Justiça do Rio determinou que a prefeitura da capital fluminense complete em até 48 horas o quadro de funcionários nos plantões do Hospital Municipal Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca, desfalcados após demissões e afastamento de cerca de 50% do quadro de funcionários em meio à pandemia.

A decisão acontece depois de o UOL revelar denúncia de uma enfermeira que registrou boletim de ocorrência pela morte de um paciente em um plantão sem médico no chamado "covidário", ala destinada a pessoas com sintomas compatíveis com a covid-19. O relato também foi repassado ao MPT-RJ (Ministério Público do Trabalho do Rio), que encaminhou à Justiça uma ação civil pública.

A medida obriga o poder público a fornecer EPIs (equipamentos de proteção individual) e testagem de verificação rápida de covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, para todos os funcionários.

O prazo para o cumprimento da decisão, assinada por Michael Pinheiro Mccloghrie, juiz substituto do TRT (Tribunal Regional do Trabalho), vence hoje. Em caso de descumprimento, a Prefeitura do Rio será obrigada a pagar multa de R$ 10 mil por dia.


Segundo a liminar, o Judiciário pode até intervir na unidade. O Lourenço Jorge é o hospital de referência para atendimentos de emergência na zona oeste carioca, uma das regiões que concentra mais casos de covid-19 na capital.

Vítima de bala perdida morre de covid-19

De acordo com o MPT-RJ, uma vítima de bala perdida encaminhada para a UTI do Lourenço Jorge morreu após contrair coronavírus dentro da unidade. A denúncia também cita o óbito de dois profissionais de saúde do hospital que contraíram a doença.

Entre eles, o técnico de enfermagem Jorge Alexandre de Oliveira Andrade, que morreu em 13 de abril. Ele trabalhava na área destinada a pessoas com covid-19, apesar de fazer parte do grupo de risco.

14.abr.2020 - Enterro do técnico de enfermagem Jorge Alexandre
de Oliveira Andrade, que atuava no Hospital Lourenço Jorge, na Barra,
 e morreu com sintomas de covid-19

De acordo com a CNES (Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde), o Lourenço Jorge conta com mais de 400 médicos no seu quadro de funcionários. Mas, segundo a ação civil pública, 50% dos médicos foram afastados por problemas de saúde desde o começo da pandemia, causando desfalques nos plantões.

Uma vistoria feita pelo Cremerj (Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro) constatou que não havia médico clínico responsável na madrugada da última sexta-feira (1º). Conforme a denúncia, apenas um plantonista fazia o atendimento remoto. O problema também foi constatado em um levantamento da escala de plantões entre 24 e 30 de abril, segundo o órgão.


UOL teve acesso com exclusividade à ação civil pública apresentada pelo MPT-RJ, que ainda conta com informações repassadas pela AMB (Associação Médica Brasileira) e pelo Coren-RJ (Conselho Regional de Enfermagem do Rio) desde o começo da pandemia.

Suporte remoto no CTI, denuncia Cremerj

Na vistoria feita pelo Cremerj, anexada à ação do MPT-RJ, havia nove pacientes com sintomas compatíveis com a covid-19 na ala chamada de "covidário" do Lourenço Jorge —cinco deles estavam sob ventilação mecânica e precisavam de cuidados intensivos. "Não há no momento médicos no local, ficando os médicos do CTI dando suporte remoto aos médicos plantonistas", citou o relatório.

Ainda segundo o documento, 20 médicos estavam afastados com suspeita de covid-19 entre os dias 14 e 29 de abril.

Onde estão os médicos? Concursos públicos foram abertos, e as vagas não estão sendo ocupadas. É preciso que as autoridades atuem de forma conjunta para resolver um problema emergencial

Viviann Brito Mattos, procuradora do MPT


"O Lourenço Jorge vem passando por dificuldades, agravadas pela pandemia. Há o excesso de plantões. Isso causa estresse, compromete a saúde mental e fragiliza o organismo dos profissionais do hospital, que ficam mais suscetíveis para contrair a doença. Com isso, eles se tornam vetores de transmissão e acabam contaminando outras pessoas", argumenta.

Teste para funcionários sorteados, diz procuradora

Ela também criticou uma ação de testagem para funcionários do Lourenço Jorge, na semana passada, restrita apenas a alguns profissionais de saúde. "Aquele ambiente de trabalho é para todos. Eles [os gestores do hospital] fizeram testes por sorteio. O município não pode autorizar esse tipo de conduta."

14.abr.2020 - Movimentação no Hospital Municipal Lourenço Jorge, na Barra,
zona oeste do Rio de Janeiro

Um enfermeiro que atuava na área destinada a pacientes com covid-19 disse não ter tido acesso ao teste. Com sintomas compatíveis com a doença, como dores no peito e na garganta, ele pediu acesso ao exame. Como resposta, ouviu que os profissionais já haviam sido selecionados.

"Trabalho no 'covidário', em uma sala para pacientes intubados, onde há muita exposição. Mesmo assim, não me deram acesso ao teste. Disseram que já havia uma escala com nomes. Um absurdo", reclamou o profissional, que optou pelo anonimato.

O que diz a Prefeitura do Rio

Procurada pelo UOL, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) não se manifestou sobre a decisão da Justiça. Mas informou que serão contratados 28 médicos clínicos gerais em caráter emergencial para suprir a escassez de profissionais nos plantões do Hospital Lourenço Jorge.

"São modificações de rotina, que acontecem em qualquer unidade da rede municipal de saúde [...]. Assim como em outros hospitais, o Lourenço Jorge vem recebendo os equipamentos de proteção individual necessários e terá seu quadro de recursos humanos recomposto, após o afastamento de médicos com sintomas respiratórios ou classificados como integrantes dos grupos de risco", informou a pasta, em nota.


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