Dois dos três integrantes da sindicância já responderam a processos na Justiça. Secretaria de Saúde afirma que não há investigações internas contra eles.
Fachada do Hospital Regional de Samambaia |
O Governo do Distrito Federal nomeou dois ginecologistas acusados de negligência para integrarem a sindicância que investiga acusações de negligência e violência obstétrica no Hospital Regional de Samambaia (HRSam)
Um deles é réu em uma ação criminal por homicídio, em decorrência de suposto erro médico. Já uma outra especialista da comissão foi alvo de pelo menos três processos por negligência. Em dois deles, o GDF foi condenado a indenizar os pacientes.
Questionada pelo G1, a Secretaria de Saúde se limitou a informar que “os dois servidores citados no e-mail não respondem a Processo Administrativo Disciplinar (PAD)”. No entanto, a pasta não respondeu se existe problema na escolha deles para conduzir a sindicância que vai investigar negligência e violência obstétrica.
A comissão foi instaurada na última sexta-feira (19). O objetivo do grupo é investigar as denúncias de negligência e violência obstétrica contra médicos do HRSam.
O caso foi revelado pelo G1 e há, pelo menos, 15 denúncias registrados por pacientes na Polícia Civil.
Quem são os médicos
O ato que instaurou a comissão nomeou três médicos para liderarem as apurações. Apenas Gisele Juliana Silva não aparece em nenhuma investigação.
O ginecologista Cláudio Lucio de Medeiros Albuquerque é réu em uma ação penal por homicídio culposo – quando não há intenção de matar. Segundo o Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT), a conduta “omissa” do profissional foi responsável pela morte de um recém-nascido (veja mais abaixo).
A reportagem entrou em contato com o advogado do médico às 19h desta segunda-feira (22). A defesa, no entanto, pediu que a ligação fosse retornada em horário comercial.
Miltair Baeta de Mello, ginecologista que atua no Hospital Regional de Planaltina (HRPL), foi acusada de negligência em pelo menos três ocasiões. Em duas, a Justiça determinou ao Governo do Distrito Federal que pague indenização às pacientes atendidas pela médica. Em outra, ela foi inocentada (veja detalhes abaixo).
O G1 não conseguiu contato com a ginecologista e nem com a defesa dela. O espaço está aberto para manifestação.
Morte de bebê
O processo em que o médico Cláudio Lucio de Medeiros Albuquerque é réu diz respeito a morte de um bebê em 2014. Segundo a denúncia, uma gestante deu entrada no Hospital Materno-Infantil de Brasília (Hmib) com "perda de líquido".
A equipe do Hmib recomendou a transferência da paciente para o Hospital Regional da Asa Norte (Hran), onde atuava Albuquerque.
Fachada do pronto socorro do Hospital Regional da Asa Norte (Hran), em Brasília |
O MP afirma que, mesmo ciente do quadro da gestante, o ginecologista realizou apenas “exame clínico sucinto e incompleto, o qual ele sequer anotou no prontuário médico”. Ainda de acordo com a denúncia, o médico não executou procedimentos obrigatórios ao quadro apresentado pela paciente.
Claudio Albuquerque liberou a gestante. Além disso, reclamou com as especialistas do Hmib que encaminharam a mulher ao Hran, diz o documento do Ministério Público.
Ainda segundo o MP, "a mulher ficou por horas na sala de espera do hospital, até que foi atendida por uma outra médica, que também não realizou exames e deu alta à gestante".
No dia seguinte, diz a denúncia, a paciente voltou à unidade com fortes dores, mas o bebê dela já estava morto.
Um laudo do Instituto Médico Legal apontou que a causa da morte da criança foi uma infecção. O Ministério Público diz que a conduta dos médicos retardou o diagnóstico e "contribuiu, de forma decisiva, para o óbito".
Segundo o MP, Claudio Albuquerque e a colega foram “negligentes” e "optaram conscientemente, cada qual a seu turno, por prestarem sucessivos atendimentos omissos, com o que permitiram a evolução, sem óbice da infecção causadora do quadro clínico”.
A denúncia contra o médico foi apresentada em fevereiro de 2019 e aceita pela Justiça. O processo está em fase de instrução.
Intestino perfurado
Fachada do Hospital Regional de Planaltina, no DF |
O nome da ginecologista Miltair Baeta de Mello aparece em, pelo menos, três ações na Justiça. Ela não foi condenada porque a o Judiciário entendeu que a responsabilidade pela conduta da servidora é do GDF.
Em maio passado, o Executivo foi condenado a pagar R$ 100 mil a uma mulher que teve parte do intestino perfurado durante cesariana conduzida por Miltair. No processo, a paciente diz que passou pela cirurgia em dezembro de 2010, no Hospital Regional de Planaltina.
Segundo a ação, dois dias após a operação a mulher foi liberada, mesmo sentindo fortes dores abdominais. Logo após receber alta, no entanto, voltou à unidade carregada por familiares já que "não conseguia nem ficar em pé".
Ao chegar no hospital, a mulher foi novamente internada e recebeu a informação de que teria que passar por outra cirurgia. Porém, o motivo para o procedimento não foi explicado.
Segundo a sentença, só quando já estava internada, após a operação, é que a paciente soube que parte do intestino havia sido perfurado durante a cesariana.
A mulher conta que, por causa do erro médico, teve que usar uma bolsa de colostomia. Na decisão, o juiz Paulo Afonso Cavichioli Carmona ressaltou que os médicos sequer avisaram a paciente sobre os problemas enfrentados na cirurgia.
“ [...] a autora recebeu alta com anotação em seu prontuário médico de inexistência de intercorrências. É dizer, a requerente foi colocada em situação de risco de vida por negligência da equipe médica”, diz a decisão.
Em 2007, o GDF também foi condenado a indenizar uma paciente que passou por procedimento de retirada de útero com a médica Miltair de Mello. Após a operação, a mulher passou a sofrer de incontinência urinária.
Após denúncias, GDF abre sindicância para apurar negligência em hospital público do DF |
Conselho Regional de Medicina
Questionado pelo G1 sobre os casos, o Conselho Regional de Medicina do DF (CRM-DF) informou que “foi instaurado um procedimento para apurar os fatos”.
O órgão afirma que “não comenta casos concretos devido ao sigilo processual. O Conselho apura infrações apenas no âmbito ético. Para responder judicialmente, o médico deverá ser denunciado na justiça. As instâncias civis e criminais são independentes, podendo ter desfechos diferentes”.
Denúncias no HRSam
A sindicância que será conduzida por Miltair Baeta de Mello e Cláudio Lucio de Medeiros Albuquerque vai investigar denúncias de negligência e violência obstétrica no Hospital Regional de Samambaia. A Polícia Civil, o CRM-DF e o Ministério Público do DF também apuram os casos.
De acordo com os investigadores, os registros abrangem vários tipos de conduta inadequada, desde gazes esquecidas dentro de pacientes até curetagens mal feitas.
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