sexta-feira, 19 de julho de 2019

Justiça determina que GDF indenize criança que perdeu movimento de braço após parto

Isabela nasceu com fratura na clavícula por conta de imperícia durante procedimento. No processo, GDF afirma que parto ocorreu de maneira 'absolutamente regular'.


A bebê que teria perdido movimento do braço após violência obstétrica no DF 

Sem os movimentos de um dos braços por imperícia médica durante o parto, uma criança de 3 anos e 8 meses que nasceu na rede pública de saúde do Distrito Federal recebeu, da Justiça, direito a receber R$ 60 mil em danos morais e estéticos, além de pensão vitalícia do GDF.

A decisão foi tomada na última sexta-feira (12), após o advogado da família, Leonnardo Morais, recorrer da sentença na primeira instância. Ao G1, a Procuradoria-Geral do DF informou que "ainda não foi notificada da decisão e que irá avaliar se apresentará recurso".

Fachada do Hospital Regional de Taguatinga, no Distrito Federal

O caso ocorreu em outubro de 2015 no Hospital Regional de Taguatinga. Naquele mês, a recém-nascida Isabela Rodrigues foi diagnosticada com "fratura na clavícula esquerda associada à lesão de plexo braquial" – uma paralisia no braço. A fratura teria sido causada por imperícia na realização do parto.

Por conta disso, a bebê nasceu com "postura assimétrica" e sem conseguir movimentar ombro, cotovelo, mão e dedos. Ela passou seis dias na terapia intensiva e outros quatro internada na UTI neonatal.

"Parecia que o braço não era dela", disse a mãe, Jane Rodrigues, ao G1. "Na minha percepção de mãe, as médicas deveriam perder o CRM [registro médico]."

"Hoje, ela já consegue mexer um pouco, mas é muito limitado. Não leva nada à boca, o crescimento do braço é diferente do outro, a sensibilidade é pouca."

Tribunal de Justiça do Distrito Federal

Em decisão colegiada, o Tribunal de Justiça do DF determinou o pagamento de R$ 30 mil por danos morais e mais R$ 30 mil por danos estéticos aos pais da criança.

Isabela também deve receber uma pensão equivalente a um salário mínimo (R$ 998) por toda a vida a partir dos 14 anos, quando pode começar a trabalhar como menor aprendiz.

Fisioterapia 'pra sempre'


Logo que Isabela deixou a UTI neonatal do Hospital de Taguatinga, Jane conseguiu uma consulta no Hospital Sarah Kubitscheck – referência em reabilitação de traumas – onde, até hoje, faz acompanhamento.

A primeira recomendação médica, segundo a mãe, foi começar a fisioterapia – sem prazo para terminar. Desde então, a criança é atendida em projetos de extensão de universidades e faculdades do DF.

No entanto, há cerca de seis meses, a menina perdeu a fisioterapia. "Ela estava sendo atendida em uma universidade há um ano e meio. Por conta do tempo, tiraram ela para abrir a vaga para outra criança", explicou Jane.

"Todo o tratamento que ela fez até hoje foi porque eu corri atrás sozinha. O GDF não me ajudou em nada."

Fatalidade ou imperícia?


Casos de negligência médica e violência obstétrica não são incomuns no Sistema Único de Saúde (SUS) da capital. A Polícia Civil investiga pelo menos 11 denúncias que teriam ocorrido no Hospital Regional de Samambaia (HRSam).

Segundo as investigações, a conduta inadequada vai desde gazes esquecidas dentro de pacientes até curetagens mal feitas. Em um dos casos, um médico teria quebrado a clavícula de um recém-nascido durante o parto.

Foto do Raio-x do recém-nascido que teve a clavícula quebrada no DF

No processo da Isabela, o GDF argumenta que "a técnica utilizada pelos médicos" não foi a causa dos problemas apresentados pela bebê.

O governo também afirma que "inexistem danos estéticos ou morais" e que a conduta dos profissionais não tem relação com o "abalo à imagem, à honra ou a qualquer outro sentimento íntimo" dos pais da criança.

Sobre o parto, o GDF reconhece que foi "difícil", mas diz que "aconteceu de maneira absolutamente regular" e que foi necessária a "realização de manobra para facilitar a expulsão do bebê".

"A referida conduta observou os protocolos médicos, de sorte que os problemas de saúde apresentados pela criança decorrem de uma fatalidade", afirma.

No entanto, em depoimento à polícia, a obstetra responsável pelo parto diz que o procedimento era conduzido por uma médica residente e que, "por falta de experiência", ela não conseguiu auxiliar a expulsão da criança de forma adequada.

"No momento em que o polo cefálico [topo da cabeça] da criança saiu, ocorreu uma dificuldade de desprendimento dos ombros, na qual a Dra. C, por falta de experiência, teve dificuldades para efetuar a manobra de rotação que favorecesse a expulsão da criança", diz o boletim de ocorrência reproduzido na sentença.

Ao contrário do processo da Isabela, o advogado Leonnardo Morais afirma que, nem sempre, a Justiça reconhece que houve falha médica nos partos pela complexidade das evidências.

"É muito difícil provar a violência obstétrica. Você tem que comprovar que realmente houve uma atuação negligente, imprudente ou imperita da equipe."





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