quinta-feira, 1 de junho de 2017

SEGUNDA MORTE DE PACIENTE COM AIDS EM MENOS DE 3 SEMANAS POR DESCASO NA SAÚDE EM PERNAMBUCO 30/05/2017



A Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero tem acompanhado ativamente as várias violações de direitos às pessoas que vivem com HIV/AIDS em Pernambuco. Temos denunciado continuamente ao Ministério Público sucessivos casos de falta de medicamentos (antirretrovirais e para infecções oportunistas), assim como a dispensação de remédios vencidos às pessoas que vivem com HIV no Estado. Como integrante da Articulação AIDS em Pernambuco, nossa instituição tem também, há mais de dois anos, denunciado a falta de leitos nos hospitais de referência e a exígua quantidade de testes anti-HIV oferecidos na capital pernambucana.

As tragédias se acumulam, diariamente, no acompanhamento às pessoas que buscam os serviços de Saúde. Com mais uma morte notificada nesta terça-feira (30/05/2017), a Gestos registra o segundo óbito em menos de três semanas de pessoas acompanhadas pela ONG, devido ao inaceitável atendimento oferecido pelo sistema de saúde referenciado para a Aids no Estado de Pernambuco.

As mortes destas pessoas nos causam dor, frustração e sensação de impotência, diante de tamanha ruína da Saúde do Estado. Nos dois casos, um roteiro de negligência e descaso.

OS CASOS


 O paciente que veio a óbito nesta terça-feira procurou o Hospital Correia Picanço, onde já era atendido, no dia 05 de maio, e não foi internado por não haver leitos disponíveis, sendo encaminhado para casa. Com o agravamento do seu estado de saúde, o paciente voltou a procurar o hospital e, desta vez, foi encaminhado no dia 15 de maio para o Hospital Otávio de Freitas – onde a situação é de calamidade e de total desrespeito aos direitos humanos básicos.

Nesse espaço, o que a Gestos encontrou foi uma situação semelhante às vivenciadas numa guerra – quando a realidade permite fazer apenas o mínimo e não o que seria necessário para garantir o tratamento e a saúde das pessoas, com situações de abandono absoluto da maioria dos doentes que ali parecem ter sido “depositados”.

O usuário da Gestos permaneceu neste hospital por dez dias, sem os cuidados devidos. Além de estar acomodado num corredor da Emergência, o paciente esteve todo esse tempo deitado numa maca rente ao chão, ao lado da entrada de um banheiro, com o prontuário embaixo do colchão da maca. Para agravar o que já era inaceitável, as medicações não foram ministradas nos intervalos corretos porque tal procedimento só pode acontecer após visita médica, que não tinha horário ou dia certo para acontecer.

A Gestos constatou que somente houve mudanças no atendimento ao paciente após a visita de duas técnicas da ONG (enfermeira e assistente social) ao hospital, para acompanhar a situação. Tal acontecimento exige reflexão sobre a lógica de funcionamento desse sistema para as demais pessoas, que nem sempre contam com o apoio de alguém próximo. O tempo de 10 dias esperando por cuidados intensivos agravou a situação deste paciente, que morreu nesta terça-feira, 30 de maio de 2017.

O segundo caso acompanhado pela Gestos no mês de maio/2017 aconteceu no município do Cabo de Santo Agostinho. Nesta denúncia, houve falha nos três níveis de atenção à saúde: primário, secundário e de alta complexidade. Um misto de preconceito, desrespeito e descaso produziu mais uma morte que poderia ter sido evitada.

Nesta situação, o posto de saúde, a partir de pré-julgamentos sobre a realidade familiar do paciente, demorou vários dias para fazer uma visita de acompanhamento. A suposição era de que a família estaria inventando uma desculpa para se livrar do doente. Com o estado agravado após uma crise convulsiva, a família acionou o SAMU – que não compareceu. Desesperada, recorreu ao Uber para levá-lo à UPA, que apenas administrou duas fases de soro antes de encaminhá-lo de volta para a sua residência – o que é praxe nas UPAS administradas pelas Organizações Sociais (OS) em Pernambuco.

A atenção do serviço de saúde só aconteceu após intervenção da Gestos e intermediação do SAE (Serviço de Atenção Especializada) daquele município – que conseguiu que uma enfermeira fizesse uma visita domiciliar, que resultou no encaminhamento do paciente para o Hospital Mendo Sampaio e, em seguida, para o Hospital Correia Picanço. Esta pessoa ficou nada menos que 10 horas esperando a liberação de um leito antes de ser internada no isolamento respiratório e, posteriormente, na UTI. O paciente veio a óbito 10 dias depois do internamento no Correia Picanço.

Longe de ser uma exceção, estas situações fazem parte dos relatos diários de quem precisa de atendimento em Pernambuco e são frequentemente denunciadas por quem trabalha nos serviços de saúde, pelos usuários, por quem atua nos movimentos sociais e nas organizações não-governamentais. Entretanto, nada muda.

Estamos fartos(as) de apresentar denúncias à Promotoria de Saúde do Ministério Público de Pernambuco;
Estamos fartos(as) de denunciar estas situações nos Conselhos de Saúde;
Estamos fartos(as) de escrever documentos para os mandatários desse Estado;
Estamos fartos(as) de reuniões com autoridades que nada decidem;
Estamos fartos(as) de não haver punição a tanta negligência e descaso;
Queremos saber onde está o dinheiro para o HIV e a AIDS em Pernambuco;
Queremos saber onde está o monitoramento do Poder Legislativo, que tem uma Comissão de Saúde que sequer reúne.

Onde está a responsabilidade do Governo de Pernambuco?

A Gestos e as pessoas que vivem com HIV/Aids em Pernambuco exigem uma resposta.

Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero

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