segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Psiquiatra da rede pública é condenado por dar bebida alcoólica a paciente e amigos adolescentes



Um psiquiatra da rede pública do Distrito Federal foi condenado a dois anos e oito meses de prisão em regime aberto – quando a pessoa trabalha durante o dia e fica em casa durante a noite – por dar bebida alcoólica a cinco adolescentes. O Tribunal de Justiça informou em 27 de outubro que a sentença transitou em julgado (quando não há mais possibilidade de recurso). A Secretaria de Saúde abriu processo administrativo contra o servidor.

As cinco vítimas são do sexo masculino. Uma delas foi paciente do acusado no Centro de Orientação Médico Psicopedagógica (Compp). O local é voltado a crianças e adolescentes e atende desde casos leves de sofrimento psíquico até transtornos mentais considerados mais graves, como autismo, psicoses e neuroses.

Segundo a denúncia, o médico deu um celular para o rapaz, que na época tinha 14 anos, e passou a manter contato com ele. O garoto o incluiu em um grupo de WhatsApp que mantinha com nove colegas de escola para discutir jogos online. Depois disso, o psiquiatra convidou o jovem para lanchar e jogar basquete, e o menino pediu para levar alguns amigos.

O acusado buscou o grupo na porta da escola, o Centro Educacional n° 5 de Taguatinga. No carro havia uísque, cerveja e vodca. Pelo menos três jovens beberam, e dois passaram mal.

Um dos adolescentes contou, em depoimento, que foi à farmácia comprar remédio para interromper os vômitos dos colegas. O paciente do médico relatou que saiu com ele para beber "uma sete ou oito vezes".

Os episódios aconteceram entre 28 de outubro e 10 de novembro de 2015. À Justiça, o psiquiatra negou ter oferecido bebida alcoólica ao grupo, mas admitiu que não os impediu de beber.

Ele também alegou ter ficado "bastante ocioso" durante greve na rede pública – o que justificaria a aproximação do grupo – e declarou não saber que sua conduta era tipificada como crime.

"[Ele disse em depoimento] que não bebeu no dia dos fatos; que saiu de casa com vontade de beber, mas não bebeu; que pegou dois dos meninos no colégio e outros dois depois; que do colégio ficou dando voltas em Taguatinga; que o objetivo de colocar os meninos dentro do carro era entretenimento."

Além disso, o médico alegou ter histórico como voluntário (inclusive na Vara da Infância e da Juventude) e disse que atendeu mais de 500 pacientes só no Compp, sem nunca ter tido problema com eles ou familiares.

Por fim, pediu a aplicação do princípio da insignificância ao caso, dizendo que os jovens não sofreram nenhum prejuízo e que já tinham ingerido bebida alcoólica anteriormente.

Para o juiz responsável pelo caso, João Lourenço da Silva, não há dúvidas da responsabilidade do psiquiatra na história. O médico também foi condenado ao pagamento de 13 dias-multa, no valor de um trigésimo do salário-mínimo vigente na época – ou seja, R$ 341,47 – e teve os direitos políticos suspensos.

"Não vejo nos autos qualquer circunstância que exclua a ilicitude do fato ora analisado ou que exclua ou diminua a imputabilidade do acusado que, pois, era imputável, tinha plena consciência dos atos delituosos que praticou e era exigível que se comportasse de conformidade com as regras do direito", afirmou o magistrado.

Como o caso foi descoberto?

Estranhando o comportamento do filho, a mãe de um dos adolescentes procurou a direção da escola. Ela disse desconfiar que algum adulto rodeava o jovem nas imediações da escola e o influenciava a usar bebidas alcoólicas. Uma semana depois, a mulher levou imagens do WhatsApp com a foto do psiquiatra.

O vice-diretor da escola chamou os rapazes para conversar. De início, os jovens negaram envolvimento com o médico e depois confessaram que saíram com ele para beber. Um sexto garoto, que não tinha participado das saídas, contou que queria entrar para o grupo.

"De início a impressão era de que os alunos queriam se aproveitar das vantagens que o réu oferecia, mas depois todas as vítimas disseram saber que a intenção do réu era de se aproximar sexualmente deles."

À Justiça, todos negaram ter tido qualquer envolvimento de cunho sexual com o acusado. O caso foi denunciado à Polícia Civil e ao Ministério Público. Repercussão do caso

Durante o processo, o Conselho Regional de Medicina fez uma censura pública ao psiquiatra. Além disso, a Secretaria de Saúde o afastou do Centro de Orientação Médico Psicopedagógica (Compp). O local onde ele atende atualmente não foi informado.

A Corregedoria da pasta abriu processo administrativo disciplinar. O prazo para conclusão do trabalho também não foi divulgado. "Somente depois de concluído o processo será definida a punição", disse a pasta ao G1.

O que diz o ECA?

O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê entre 2 e 4 anos de prisão, além de multa, para casos do tipo. De acordo com o artigo 243, é proibido vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar, ainda que gratuitamente e de qualquer forma, bebidas alcoólicas ou produtos que causem dependência física e psíquica a crianças e adolescentes.

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