Força-tarefa da PCDF, do MPDFT e da Secretaria de Saúde apurou 34 ocorrências contra profissionais da unidade pública de saúde
A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) concluiu as investigações que apuravam denúncias de violência obstétrica no centro de ginecologia e obstetrícia do Hospital Regional de Samambaia (HRSam). Ao todo, os investigadores apuraram 34 ocorrências registradas por pacientes que se sentiram lesadas no atendimento. Segundo o delegado-chefe da 26ª Delegacia de Polícia (Samambaia Norte), Cícero Jairo, a maior parte dos laudos solicitados ao Instituto de Medicina Legal (IML) se mostraram inconclusivos para as acusações de negligência médica.
A quantidade de documentos que apontam possível violência obstétrica e mais detalhes das investigações serão revelados em coletiva de imprensa marcada para esta terça-feira (12/11/2019). A PCDF mostrará os resultados da força-tarefa de apuração, que contou com o apoio da Promotoria de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde (Pró-vida) do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e da 32ª Delegacia de Polícia (Samambaia Sul). Representantes da Secretaria de Saúde (SES-DF) também estarão presentes.
A força-tarefa teve início em setembro deste ano, quando 31 mulheres procuraram a PCDF para denunciar supostos casos de negligência médica. Desde então, foram computadas outras três acusações. As histórias registradas junto à Polícia Civil seguiam o mesmo padrão, e o fato chamou atenção dos investigadores.
Dado como morto
Na época, o Metrópoles trouxe o relato de uma jovem de 16 anos. A estudante V. G. S. viveu horas de apreensão após, grávida, dar entrada no HRSam apresentando fortes dores na região da barriga. Na unidade pública de saúde, foi recebida e atendida por uma médica que, sem realizar qualquer exame, diagnosticou a morte precoce de seu bebê e receitou um abortivo.
Nove horas depois, a gestante entrou em trabalho de parto e, contrariando o diagnóstico da profissional, deu à luz um menino cujo coração ainda batia. A surpresa e a alegria da mãe e dos familiares duraram exatamente uma hora e 40 minutos. Após deixar a sala de cirurgia para se instalar no quarto, ela foi informada por um médico que seu bebê prematuro, de seis meses, havia sofrido complicações e não resistiu.
O óbito foi registrado às 23h30 daquela data. A adolescente sustentou que a morte da criança é resultado da negligência dos profissionais e poderia ter sido evitada com um diagnóstico preciso.
“A médica apenas tocou na minha barriga e disse que meu bebê tinha morrido. Sem fazer exames, me medicou. Mais tarde, por volta das 19h, outro médico me examinou, com um estetoscópio, e disse que não conseguia ouvir os batimentos cardíacos. Mesmo assim, meu filho nasceu vivo. Se fosse em qualquer outro hospital ou qualquer outro médico, ele poderia estar comigo hoje”, desabafou a jovem.
Gaze esquecida na vagina
Erika Pereira Nascimento, 25 anos, foi outra a denunciar o HRSam. Não bastasse o trauma de perder o primeiro filho por complicações na gestação, de acordo com a mulher, os médicos responsáveis pelo parto do natimorto esqueceram, no útero, duas gazes utilizadas no procedimento cirúrgico.
Erika relatou ter procurado a unidade após realizar exame de ultrassom que apontou a morte precoce do bebê. Diante da comprovação, a equipe optou pela internação da jovem. “Eles [médicos] disseram que não tinham como fazer mais nada. Realizaram os procedimentos de internação, mas o parto só veio no dia seguinte, por volta das 5h.”
Dois dias depois, a autônoma recebeu alta médica e voltou para casa. No entanto, durante a recuperação, começou a ter complicações. “Todo meu resguardo aconteceu da maneira como me foi recomendado e, no fim dele, comecei a sentir umas dores. Percebi que saía um líquido com odor forte e sangue da minha vagina. No início, achei que era parte do próprio resguardo”, conta.
Cinco dias após os sangramentos na região uterina, as dores se intensificaram, levando-a a procurar novamente o HRSam. “Eu sentia uma dor muito forte. Quando tocava, parecia ter um caroço. Fui ao hospital ver o que era, e o médico retirou de dentro da vagina a primeira gaze, que estava podre. Em seguida, outra.”
Omissão
Segundo Erika, o profissional responsável pela extração dos materiais hospitalares omitiu a informação no prontuário, em uma tentativa de “tentar esconder o erro médico”. À reportagem, a jovem disse ter procurado a Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) no dia seguinte, para denunciar o fato, e ter se sentido “esquecida”.
“Foi tudo muito difícil. Primeiro, perdi meu primeiro filho, em um hospital que não tinha atendimento bom, que foi negligente. Fui esquecida, e minha irmã teve de procurar os médicos para que eles me atendessem. Depois do parto, quando estava me recuperando e sofrendo meu luto, ainda tive que passar por tudo isso, inacreditável.”
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