quinta-feira, 9 de agosto de 2018

A RESPONSABILIDADE CRIMINAL DOS MÉDICOS E DE FALSOS MÉDICOS




Adriana Filizzola D’Urso. FOTO: DIVULGAÇÃO


A recente morte de Lilian Calixto, após se submeter a um procedimento estético com um médico, conhecido como Doutor Bumbum, trouxe à tona inúmeros outros casos de pessoas que morreram ou tiveram sérias complicações em decorrência de procedimentos estéticos realizados não só por médicos, mas também por profissionais que não estavam autorizados a efetuar estas práticas.

 Diante destes casos, é importante esclarecer a responsabilidade criminal do médicoou de alguém que pratica atos médicos sem a devida qualificação técnica e autorização para tanto, pois suas ações podem provocar sequelas e até a morte daquelesque se submetem a estas intervenções.

 Cada vez mais, as pessoas buscam satisfazer as suas expectativas(e as da sociedade) em relação à aparência e ao corpo, através de procedimentos estéticos,realizados por profissionais que possam auxiliá-las neste anseio. Por vezes, estes procedimentos não são realizadosem uma clínica dotada da estrutura mínima necessária e recursos para tal intervenção, sendo feitos na própria casa do paciente, em centros estéticos e, até mesmo, em salões de beleza.

 O profissional (médico ou não) que realiza tais procedimentos em local inapropriado assume o risco, caso o paciente venha a falecer em decorrência de complicações, de responder pelo crime dehomicídio doloso (artigo 121 do Código Penal),na modalidade do dolo eventual, que severifica quando o profissional tem conhecimento do alto risco para a vida do pacientee, mesmo assim, prosseguecom o procedimento, estando sujeito a uma pena de 6 a 20 anos de reclusão.

 Por outro lado, não ocorrendo a morte, mas restando sequelas daquele procedimento estético que foi mal realizado ou que teve complicações, o médico ou outro profissional que o realizou, poderá responder pelo crime de lesão corporal dolosa (artigo 129 do Código Penal),que poderá ser leve(com pena de 3 meses a 1 ano de detenção), grave (com pena de 1 a 5 anos de reclusão), ou até gravíssima(pena de 2 a 8 anos de reclusão).

 Tanto o crime de homicídio, como o de lesão corporal poderá ser enquadrado na modalidade culposa (§ 3º do artigo 121 e § 6º do artigo 129, ambos do Código Penal), quando o autor (seja elemédico ou não) agir com negligência, imperícia ou imprudência, sem a intenção de produzir o resultado (dolo), nem assumindo o risco de produzi-lo (dolo eventual). Esse enquadramento é sempre um desafio para o aplicador da lei, pois a linha divisória entre as condutas é muito tênue, e a conclusão final dependerá das provas produzidas durante a investigação ou processo.

 Por fim, resta lembrar que aquele que pratica atos médicos não estando qualificado e nem autorizado para exercer a medicina, além de responder criminalmente pelas lesões provocadas ou pelo homicídio (no caso de morte), responderá, também,pelo crime de exercício ilegal da medicina (artigo 282 do Código Penal), com pena de 6 meses a 2 anos de detenção, mesmo que realize o procedimento estético gratuitamente.

 Verifica-se, portanto, que a lei brasileira protege, o quanto possível, o paciente, de modo a punir criminalmente osmédicos ou falsos médicos, que não se ocupam dos cuidados essenciais para a realização de procedimentos estéticos, ou que incorrem em erros e, com isso, acarretam graves consequências ao paciente, podendo até causar sua morte.

*Adriana Filizzola D’Urso, advogada criminalista, mestre e doutoranda em Direito Penal pela Universidade de Salamanca (Espanha), pós-graduada em Direito Penal Econômico e Europeu pela Universidade de Coimbra (Portugal), e em Ciências Criminais e Dogmática Penal Alemã pela Universidade Georg-August-Universität Göttingen (Alemanha), membro da Comunidade de Juristas de Língua Portuguesa e também da Associação Brasileira das Mulheres de Carreiras Jurídicas

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