quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Médico é acusado de deformar rostos de pacientes no DF e Goiás

De acordo com uma das pacientes, Wesley Murakami fez mais de 40 vítimas
 
(foto: Arquivo Pessoal )
 
Insatisfeito com o nariz, o cirurgião-dentista Flávio Roberto Rodrigues, 35 anos, sempre desejou fazer um procedimento estético. Assim que teve a oportunidade, não imaginou que a realização do sonho se tornaria o pior pesadelo de sua vida. Após passar por uma bioplastia facial, ele teve efeitos colaterais em toda a face. Segundo Flávio, ele foi vítima de um erro cometido pelo médico Wesley Murakami, em 2016, que atende no Distrito Federal e em Goiânia.
 
Flávio conheceu o profissional por meio de um amigo e foi atendido em Goiânia. O intuito era mexer apenas no nariz, no entanto, o médico teria indicado inúmeros defeitos no rosto do rapaz e o incentivando a fazer outros procedimentos. Murakami teria mostrado casos de antes e depois de pacientes, convencendo o rapaz a fazer um preenchimento de mandíbula com polimetilmetacrilato (PMMA), uma espécie de gel usado para o preenchimento cutâneo de pequenas áreas do corpo.
 
“Ele passou a focar no meu rosto e a dar menos importância para o meu nariz. Nunca me senti feio, mas ele começou dizer que meu rosto era infantil, e que se eu mexesse em mais algumas partes eu ia me surpreender. Então decidi fazer. Mal sabia que ali iniciaria uma das maiores dores da minha vida. O procedimento que seria de 40 minutos, durou três horas”, relatou Flávio.
 
Assim que finalizou a bioplastia e foi até o espelho, o rapaz percebeu que o rosto estava completamente deformado. “Ele dizia que era normal e que voltaria em alguns dias. Mas depois disso tive nódulos e pus nos lábios. Tive uma série de problemas. E ele ainda mexeu quatro vezes no meu nariz. Cada vez, piorava mais. Tudo para ele era normal, mas só consegui ficar melhor passando pela mão de outros médicos”, disse o cirurgião-dentista. 
 

Mais de 40 vítimas no DF e Goiás

 
Uma paciente do DF, que não quis se identificar, 25, revelou que mais de 40 vítimas do médico, tanto do DF quanto de Goiás, estão em um grupo de WhatsApp. E as histórias são parecidas. “Ele sempre indica defeitos nos pacientes para poder mexer mais. Eu só queria fazer um tratamento de celulites e ele me recomendou fazer mandíbula, boca, nariz e maçã do rosto. Como ficou muito caro, só fiz mandíbula e meu rosto ficou completamente inchado”, contou.
 
Aos pacientes, o médico afirma que os efeitos colaterais ocorrem por eles não seguirem os retornos da forma correta. Mas, segundo relatos, todos retornaram de quatro a cinco vezes após o procedimento. “Nós seguimos tudo certo, mas ele não admite o erro. Eu já denunciei ele para o Conselho Regional de Medicina (CRM). O pessoal do grupo também está se movimentando para isso. Alguns ainda têm medo, mas a gente tem que fazer alguma coisa."
 
De acordo com a Polícia Civil de Goiás, no estado existem cinco ocorrências registradas por lesão corporal, em fase de investigação, e um inquérito instaurado. Como estão em segredo de Justiça, não dá para saber se existe mais de uma vítima por investigação. No DF, a Polícia Civil afirmou não ter nenhum inquérito aberto contra o médico.
 
Ontem, uma outra paciente, que também não quis se identificar, 26, moradora de Goiânia abriu uma boletim de ocorrência na 4ª Delegacia de Polícia da capital goiana. Para ela, está havendo uma negligência por parte do CRM, que deveria interferir o quanto antes. “É desumano o que ele faz. Ele trouxe danos gravíssimos na vida de muita gente. Soubemos de pessoas que se suicidaram, outras perderam o noivo, o emprego. O CRM tem que pará-lo”, advertiu a paciente.
 

Registro 

 
Em nota, o Conselho Regional de Medicina de Goiás (Cremego) informou que Murakami tem inscrição no órgão desde 2003, mas que não há nenhuma especificação médica registrada. Em 23 de outubro de 2018, ele foi punido com uma censura pública, veiculada no Diário Oficial do Estado de Goiás, por infração dos artigos 1º, 34 e 115 do Código de Ética Médica, referentes à causa de danos ao paciente, omissão de diagnóstico e prognóstico e anunciar título para o qual não possa comprovar, respectivamente. 
 
No Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF), o médico tem uma sindicância instaurada e um processo ético em andamento. As informações correm em sigilo processual. Caso o médico seja processado, passará por julgamento ético-profissional e, se for condenado, poderá sofrer as penas que vão desde a advertência confidencial até a cassação definitiva do registro profissional. 
 

Riscos

 
Sobre o uso do polimetilmetacrilato, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica Regional do Distrito Federal (SBCP-DF) alerta a população sobre os riscos da utilização indiscriminada desta substância, que pode causar necroses e inflamações crônicas na região da aplicação. Além disso, o PMMA não se fixa no local injetado e pode se movimentar com o passar dos anos, sem a possibilidade de remoção do produto da pele. Por esses motivos, a SBCP, o Conselho Federal de Medicina (CFM) e seus departamentos regionais não recomendam o uso desse procedimento estético. 
 
O cirurgião plástico Sérgio Feijó ressalta que hoje existem produtos não acrílicos melhores que o PMMA. Apesar de mais caros, são mais corretos para a saúde. “Esse tipo de substância está na mão de não médicos. Quando na mão de médicos, são sem nenhum preparo. Porque a comunidade médica sabe dos riscos desse material. Os pacientes têm sua parcela de culpa, porque deveriam ficar mais cientes”, destacou.
 
Ele ainda alerta que o material é um plástico e ele traz grandes riscos, como entupimento de artérias e veias, podendo levar a cegueira e necrose de pênis para quem faz nesta região. “Existem ainda as reações tardias. Quem tem PMMA pode ter alergia que pode acontecer até 10 anos após o preenchimento”, frisou.
 

Defesa

 
O advogado de Wesley, André Bueno, disse que aguarda mais informações sobre as investigações para saber com exatidão quais são as acusações que recaem sobre seu cliente. “Estive com o delegado responsável pelos casos nesta semana. Ele não me adiantou nada sobre o caso, estão nos procedimentos iniciais de investigação para saber se há imperícia do dr. Murakami nos casos denunciados”, afirmou. 
 
Sobre a acusação de negligência, Bueno alegou que as aplicações de PMMA não exigem especialização, uma vez que não se trata de um procedimento cirúrgico e que todo o material utilizado segue as normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “Esses são procedimentos de modelações reparadoras, de maneira simples, feitos em consultório com toda a técnica e materiais permitidos pela legislação atual. Nós estamos à disposição da Polícia Civil para mostrar toda a documentação que prova isso”, completou. 
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário