quinta-feira, 23 de abril de 2020

Mãe denuncia negligência em tratamento de enfermeira que morreu com a Covid-19 aguardando por leito de UTI

A enfermeira Williane Lins dos Santos, de 30 anos, faleceu na sexta-feira (17), no Hospital João Murilo de Oliveira, em Vitória de Santo Antão, na Zona da Mata pernambucana.


Uma das vítimas do novo coronavírus em Pernambuco foi a enfermeira Williane Lins dos Santos. Ela morreu na sexta-feira (17) no Hospital João Murilo de Oliveira, em Vitória de Santo Antão, Zona da Mata, esperando um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Segundo a mãe dela, a fisioterapeuta Maria Soares Lins, o tratamento na unidade de saúde administrada pelo governo do Estado foi negligente.


O diagnóstico da Covid-19 foi confirmado postumamente, na terça-feira (21). Williane, moradora de Vitória, que não atuava na linha de frente do combate à pandemia, deixou uma filha de seis anos

"O que me dói é, como profissional de saúde, como uma menina que sempre foi muito dedicada, prestativa, morrer sem assistência", disse a mãe. De acordo com a Maria Soares Lins, que é fisioterapeuta, a falta de assistência aconteceu desde o primeiro atendimento. A filha, Williane, começou a sentir sintomas no dia 2 de abril. A dor de garganta, segundo ela, foi diagnosticada como uma laringite. 

Dez dias depois, no entanto, o quadro não cedera. Pelo contrário: à dor de garganta acrescentaram-se outros sintomas, como o cansaço, diarreia, vômito e falta de ar. Por conta deles, no dia 12, um domingo, Wiliane voltou ao João Murilo de Oliveira.


"Ela foi atendida e nebulizada e enviada para casa de novo. Liberaram ela. Eu estava de plantão, fiquei muito aperreada, pois o estado dela era para internamento. Mas eles pediram para ela continuar isolada e afastada do trabalho e de pessoas idosas e crianças", afirmou. 

Ainda segundo a mãe, a estratégia de isolamento não funcionou. A situação de Williane piorou rapidamente. A ponto de, na quinta-feira (16), a enfermeira procurar de novo uma unidade - desta vez um posto de saúde perto de sua casa. Foi encaminhada para o João Murilo, para onde iria pela terceira vez.
 
"Chegando lá, foi pedido um leito de enfermaria, só que a assistência [foi] muito vaga. Ela passou a noite todinha aguardando esse leito de enfermaria, e nada... De manhã, seu quadro veio a se agravar. Aí foi onde comecei a ficar mais desesperada ainda, por saber da situação", declarou. 
 
Na manhã do dia 16, Maria Soares Lins falou com o médico que estava cuidando de sua filha. Foi informada de que havia sido solicitado um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para Williane. 

"Eu disse a ele: 'Doutor, sim, vaga de UTI, [mas] quando? De que horas? Qual o tempo que o senhor me dá?' E ele disse: 'Não posso lhe dar tempo, porque depende da central de leitos'", lembrou. 

Maria tentava conseguir o leito por outros meios. Pensou em recorrer ao Ministério Público, falou com uma médica amiga. Tentou de tudo. 
 
"Tinha vaga no Alfa, tinha vaga no Dom Hélder, de última hora apareceu uma vaga no Hospital São Marcos, mas, quando veio apresentar a vaga, já era tarde. Minha filha já tinha falecido", lamentou. 

A falta do leito, no entanto, não é a única queixa de Maria. Segundo ela, no João Murilo de Oliveira havia dois respiradores na sala de emergência que não foram usados em sua filha - apesar de seus repetidos pedidos de entubação.
 
"Além da falta de leito, foi a falta de assistência. A falta de entubação rápida, que era o que precisava. Eu solicitei. Ainda disse assim: 'Doutor, não me veja como uma profissional, me veja como uma mãe aflita. Mas eu não sou leiga. Eu sei o que estou lhe pedindo'. E ele não me atendeu", disse. 

A fisioterapeuta alega que as atitudes tomadas para tentar evitar a morte de sua filha foram tardias e, portanto, insuficientes. 

"O que eles alegam é só a falta de leitos. Falta leitos? Tudo bem. E eles fizeram o quê? Nada. Simplesmente nada. Depois que viram o caso, foi todo mundo chorar. Foi tarde, minha gente. Foi tarde demais", afirmou.
 
 Resposta da Secretaria de Saúde 
 
A Secretaria Estadual de Saúde (SES-PE) informou que a paciente foi admitida, na última quinta-feira (16), no Hospital João Murilo, em Vitória de Santo Antão, com quadro moderado de Srag (Síndrome Respiratória Aguda Grave). 

Na tarde da sexta (17), ainda segundo a nota, Williane teve uma piora no quadro clínico, que motivou a solicitação de uma vaga de UTI à central de regulação de leitos.

"O leito foi disponibilizado ainda na noite do mesmo dia em um hospital privado. Infelizmente a paciente teve uma piora súbita antes que fosse possível realizar a transferência", diz a nota.
 
A SES-PE ressaltou ainda o Governo de Pernambuco tem feito esforços para ampliar a rede de assistência para o atendimento de pacientes suspeitos e confirmados da Covid-19, abrindo novos leitos diariamente. O estado atingiu, nesse domingo (19), a marca de 646 leitos abertos dedicados exclusivamente para a doença, sendo 319 de UTI.  

Coronavírus em Pernambuco 


Subiu, nesta quarta-feira (22), para 3.298 o número de casos confirmados do novo coronavírus, em Pernambuco. Foram 390 novos casos em 24 horas, o maior aumento já registrado desde o dia 12 de março, quando houve as duas primeiras confirmações. O número de mortes por conta da doença Covid-19 aumentou para 282, com mais 22 registros nesta quarta.
 

G1.Globo

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