Uma moradora de Embu das Artes morreu de covid-19 depois de o centro
médico de combate à epidemia do governo Ney Santos (Republicanos), onde
procurou socorro, dizer que o que tinha “está longe de ser o
coronavírus” e a mandar para casa. A faxineira M.I.S., de 39 anos,
chegou a ficar dois dias em observação na unidade, mas recebeu como
diagnóstico que a doença estava descartada apesar de apresentar falta de
ar durante o simples ato de falar.
M. morreu após verdadeira peregrinação em busca de socorro, de luta
pela vida, mas não resistiu ao descaso – uma história de absurdos. Antes
de dar entrada no centro contra o coronavírus, a moradora, com dor no
peito e nos rins e falta de ar, foi levada no dia 25 de março pela
família até o Pronto-Socorro Central de Embu, mas o médico que a atendeu
disse que “não era nada demais”, prescreveu medicamento na veia e
mandou tomar “Buscopan” em casa.
No dia seguinte, M. mal conseguia andar. Com febre, dor de cabeça e
nas costas e muita falta de ar, ela foi levada, desta vez, ao hospital
de Cotia. Também foi liberada, mas logo teve nova piora. Irmã de M.,
Maria Irene, desesperada, ligou para o centro contra o coronavírus de
Embu e perguntou o que fazer. Indagada se a irmã tinha tido contato com
alguém que voltou do exterior, ela contou que M. trabalhou na casa da
patroa cujo filho estava com covid-19.
M. foi levada pela irmã ao centro contra coronavírus no dia 27. Ela
chegou a gravar áudios para a família para falar como estava sendo
atendida. “Até agora não consegui tomar a medicação nem fazer exames que
o médico pediu. Estou desidratada, já [me] furaram tanto”, disse.
Depois, contou: “O médico veio aqui e disse que os resultados dos exames
não saíram ainda. Está aguardando. Mas ele disse que o raio-x mostrou
que o meu pulmão está limpo”.
“Ele liberou dieta, não tinham liberado ainda, aí vão trazer café
para eu comer para ver como me sinto. A diarreia não passou. O vômito,
não tive mais. A moça [enfermeira] veio aqui com aparelhos para fazer
[medir] a pressão, e a temperatura deu 32ºC. Disse que está muito baixa.
Me cobriram, estou coberta para ver se aquece um pouco e a temperatura
levanta. O médico disse que estou muito longe de ter coronavírus, disse
que não tenho é nada”, contou.
M. falou com voz cansada – a dificuldade de respirar é o principal e
mais grave sintoma da covid-19. “Cansada é pouco, ela já estava com
muita falta de ar, muita dificuldade para falar”, diz o cunhado
Agostinho Brito. Após 48 horas em observação, M. recebeu alta, sem estar
bem. “Passados dois dias, o caso se agravou. No domingo dia 29, se ela
desmaiou umas 20 vezes foi pouco. Ligamos para o Samu. Informaram que
não tinha ambulâncias disponíveis.”
A família pôs M. num carro, desmaiada, e a levou outra vez para o
Pronto-Socorro Central de Embu. Perguntada no PS se a paciente tinha
feito exames, a irmã informou que M. tinha colhido sangue no centro
contra coronavírus do município. “Puxaram pelo número da senha. Não
havia exame nenhum”, protesta Brito. “Colheram os exames na emergência
[no PS].Resultado: infecção nos rins grave, essa infecção tomou os
pulmões”, relata o cunhado.
Não bastasse o estado crítico de M., a família teve outro dissabor.
“Um médico – que para mim não é médico coisa nenhuma, [é] um cavalo
arrogante e estúpido – não queria informar as condições da minha
cunhada, falou que não era obrigado a informar nada. Aí minha esposa
questionou: ‘É sua obrigação, sim, contar aos familiares’. Teve grande
bate-boca com esse bosta de médico, o nome é Denilson Calori. Não deu
atenção nenhuma ao caso”, acusa Brito.
Outros médicos do PS medicaram e entubaram M., e conseguiram
transferência para o Hospital Geral do Pirajuçara. “O caso dela já
estava precário, os próprios médicos de lá falaram que era só por um
milagre que ela poderia sair dessa. Mesmo com todas as medicações, o
organismo dela não reagia. Mas eles disseram que desde o primeiro
atendimento era para ter coletados exame, aí sim poderia ter combatido a
infecção, que estava no começo”, lamenta.
M. morreu no HGP, sem que os parentes pudessem dar o último adeus.
“Na sexta-feira dia 3, às 16h, veio a óbito, e mesmo assim não demos um
enterro digno para ela, saiu do hospital já embalada num saco lacrado já
dentro do caixão, e com uma hora apenas de velório”, conta, triste. No
HGP, M. foi submetida ao exame PCR para coronavírus – covid-19 que deu
entrada em laboratório no dia 6. Na terça-feira (14), saiu o resultado,
como “detectado (positivo)”.
Brito denunciou o descaso do centro montado para tratar covid-19.
“Olha como foi a negligência, o resultado do exame da minha cunhada deu
positivo ao covid-19. Ela faleceu no dia 3, e o exame foi dada entrada
[no laboratório] dia 6, e saiu ontem [dia 14] o resultado. No centro do
coronavírus no Parque Rizzo mandaram ela embora depois de dois dias de
observação, falaram que estava descartado, que estava longe de ser o
coronavírus”, diz, na rede social.
Brito questionou se o centro de Embu está qualificado para atender
casos de covid-19 e protestou contra o prefeito. “O pessoal que está
atendendo na tenda do corona são especialistas ou estão preparados para
essa pandemia? A resposta é não, uma vida se foi por falta de preparação
ou competência ou essa tenda é pura enganação ou pura politicagem? […]
Ney Santos, veja bem os médicos que estão lidando com vidas aqui no
Embu”, adverte.
M. não ficou nem com o raio-x que teria feito no centro. “Cadê que
deram? Simplesmente mandaram embora. Os exames que foram feitos no
centro do coronavírus até hoje não apareceram, não tem nada no sistema”,
diz Brito, revoltado por conta de que a cunhada foi ao local do qual se
fazia propaganda de ter atendimento adequado. “O que eu fico indignado é
que ela estava já no centro e depois mandaram ela embora, dizendo que
não tinha nada”, fala
OUTRO LAD
Em um grupo no WhatsApp sobre a saúde, Brito relatou a “negligência” do centro contra covid-19 de Embu. No grupo, tanto o secretário Raul Bueno como a secretária-adjunta Maria Serrano (Saúde) calaram. Na sexta (17), o VERBO questionou Serrano. Ela disse: “Entrar em contato com a Secretaria de Comunicação”. Este portal enviou e-mail à pasta, copiado para Raul. “O VERBO está no aguardo de resposta, @Raul Bueno e @Maria Serrano”, disse, no grupo.
Nem Raul, Serrano ou a Comunicação responderam. A reportagem também
procurou Ney e indagou que “satisfação o senhor tem a dar para a
família” de M. Ney, na sua mansão em Santa Catarina, ignorou o
sofrimento da família. No grupo, o cunhado interpelou Ney: “Prefeito, eu
sou o Brito, eu queria uma resposta sobre essa equipe que está
atendendo na tenda do coronavírus, pelo jeito não são qualificados”.
Raul e Serrano não responderam pelo chefe.
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