Ao 'Estado', procurador da República Hilton Araújo de Melo afirmou que "abusos são corriqueiros"
Pela norma existente, os estabelecimentos têm de incluir na conta enviada ao paciente ou às operadoras de saúde valores equivalentes aos que foram adquiridos Foto: iStock |
BRASÍLIA - O Ministério Público Federal (MPF) deu o primeiro passo para exigir que hospitais, clínicas e laboratórios cumpram uma regra que impede a obtenção de lucro no fornecimento de remédios e outros produtos de saúde para seus pacientes.
Pela norma existente, os estabelecimentos têm de incluir na conta enviada ao paciente ou às operadoras de saúde valores equivalentes aos que foram adquiridos. "Mas a prática é outra. Os abusos são corriqueiros", afirmou ao Estado o procurador da República Hilton Araújo de Melo.
Em recomendações enviadas para a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e para a Câmara de Regulação de Mercado de Medicamentos (Cmed), o MPF solicita que a regra em vigor seja colocada em prática e estabelecimentos, fiscalizados e punidos em caso de abusos.
Até algum tempo atrás havia apenas a determinação da proibição de cobrança de preços mais altos. A norma é de 2009. Somente este ano, a Cmed publicou uma resolução prevendo as punições possíveis para hospitais, clínicas e laboratórios que cobrassem preços a mais de seus clientes por remédios ou materiais usados nos procedimentos.
"Agora, a Cmed tem a faca e o queijo na mão. Mas precisa cortar", resumiu o procurador. As diferenças de preços são muito significativas, de acordo com levantamento conduzido pelo MPF. Um medicamento adquirido por R$ 19, por exemplo, foi cobrado na conta do paciente por R$ 359. Um outro produto, adquirido por R$ 160, saiu na conta por R$ 4.795.
Estratégia
O procurador atribui as diferenças a uma estratégia dos estabelecimentos para driblar a concorrência. Em vez de cobrar honorários para procedimentos mais altos, a saída foi empurrar os valores para medicamentos e outros produtos de saúde. "Mas é preciso transparência", diz. Mesmo nos casos em que o paciente é atendido por um plano, afirma ele, os valores indiretamente acabam caindo em seu bolso.
Advogada do Sindicato de Hospitais, Clínicas e Laboratórios (Sindhosp), Eriete Ramos Dias Teixeira diz que os valores mais altos estão longe de ser um abuso: "Há despesas de logística, armazenamento, distribuição e descarte desses produtos", afirma. "Não há como cobrar o preço da nota fiscal", completa. Eriete afirma que o sindicato deve ingressar com uma ação para impedir que a prática seja punida.
"No fim, quem pagará a conta será o próprio paciente. Se a instituição não tiver mecanismos de comprar e armazenar de forma adequada, a qualidade irá cair."
Em nota, a ANS afirmou que não se manifestaria. O presidente da CMED é o ministro da Saúde, Gilberto Occhi. Também em nota, a câmara afirma que "adotará as medidas previstas nas normas existentes, que podem variar de multa a ajustamento de conduta das instituições." No texto, no entanto, a CMED afirma que a fiscalização terá entre seus alicerces denúncias recebidas por consumidores e operadoras de planos de saúde.
A Federação Nacional de Saúde Suplementar, por sua vez, defende uma mudança no modelo de remuneração, criando alternativas para a estratégia atual, que é a de pagamento por procedimentos realizados.
A Fenasaúde, por sua vez, defende uma mudança no modelo de remuneração, criando alternativas para a estratégia atual, que é a de pagamento por procedimentos realizados. Araújo de Melo afirmou ter recebido respostas tanto da ANS quanto da CMED. "Ambos reconheceram o problema e a necessidade para se encontrar uma solução que atenda ao interesse público", diz.
O procurador afirmou que deverá agendar reunião com a ANS e CMED para discutir novas estratégias. "Caso contrário, será um verdadeiro desastre." Para ele, no entanto, punições para casos já documentados não podem ser deixadas de lado.
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