Adolescente de 16 anos denunciou médico na tarde desta quarta-feira (20). Há cinco outros boletins de ocorrências contra ele por agressão no momento do parto.
Acompanhada da família, adolescente de 16 anos denunciou agressão sofrida durante parto na maternidade Balbina Mestrinho em Manaus |
A adolescente de 16 anos que apareceu em um vídeo - divulgado nas redes sociais nesta semana - sendo agredida por um médico durante o parto, denunciou o caso na tarde desta quarta-feira (20). Na polícia, há outros cinco boletins de ocorrência contra o mesmo obstetra, por agressão. A reportagem não conseguiu contato com o médico.
“Meu primeiro e último filho. Depois disso não quero outro filho. Espero que a justiça seja feita e não aconteça com outras mulheres. Ele é muito violento, é um monstro”, disse a jovem.
O parto ocorreu dia 19 de maio de 2018, na maternidade estadual Balbina Mestrinho, Zona Sul de Manaus. A jovem não tinha passagem suficiente para a criança sair e foi supostamente agredida pelo obstetra que se negou a fazer uma cesariana.
O momento da agressão foi filmada por um dos integrantes da equipe que acompanhava o parto e publicado nas redes sociais, nove meses após o ocorrido.
Adolescente ao lado da delegada Débora Mafra |
O vídeo mostra a paciente em trabalho de parto na maternidade Balbina Mestrinho. Na ocasião, o médico aparenta estar estressado e trata a mulher de forma agressiva. Em certo ponto, ele chega a bater nas coxas da paciente.
Em seguida, uma familiar da vítima se pronuncia e afirma que vai denunciar o caso. Irritado, o médico grita para que a família o denuncie.
“Eu não tinha o vídeo, por isso não denunciamos antes. A mulher que gravou não quis enviar o vídeo por medo, eu acho. Aí o vídeo apareceu na internet e minha mãe que me ligou avisando”, disse a adolescente.
Relato
A menina contou que chegou à maternidade dia 18 de maio de 2018, por volta das 7 horas da manhã, sentindo muita dor. “Passei o dia fazendo exercícios, não podia comer nada, só tomei dois copos de suco. Na madrugada do dia 19 passei por isso”, contou.
Ela entrou em trabalho de parto às 2h e a criança nasceu às 5h33 do dia 19. “[O médico] pedia para a enfermeira segurar a minha perna, para eu não me mexer, e para outra médica subir na minha barriga para o neném sair. Minha sogra falou que ia chamar a polícia e a imprensa, e ele ficou com raiva e me bateu. Ele estava muito violento, batia na minha perna. Eu estava com muita dor, estava quase desacordada. E ele estava ali, tentando tirar o neném à força”, denunciou.
Jovem prestou depoimento na tarde desta quarta-feira (20) |
Após as reclamações, outro médico assumiu o parto. Segundo a jovem, ele fez um corte e o bebê nasceu. A menina contou ainda que passou alguns dias sem poder andar e sentindo muita dor, por conta do procedimento adotado no parto.
A jovem contou ainda que a família pensou em denunciar, e pediu para que os outros profissionais que acompanharam o parto servissem de testemunhas, mas ninguém aceitou.
“Quando a minha sogra foi falar com as enfermeiras para fazer a denúncia, elas disseram que não, porque elas trabalhavam lá. E ele era acostumado a fazer isso. Era normal aquela situação para eles, lá dentro”, lamentou a mãe.
Jovem se emocionou ao lembrar do parto. "E ele estava ali tentando tirar o nenê a força", disse |
A jovem afirmou também que na noite desta terça-feira (19), assim que o vídeo ganhou as redes sociais, uma mulher - que seria supostamente a secretária do obstetra - entrou em contato com ela para perguntar se precisava de alguma coisa.
A jovem afirmou também que na noite desta terça-feira (19), assim que o vídeo ganhou as redes sociais, uma mulher - que seria supostamente a secretária do obstetra - entrou em contato com ela para perguntar se precisava de alguma coisa.
A reportagem não conseguiu contato com o médico. O G1 aguarda, ainda, posicionamento da Secretaria de Estado de Saúde (Susam) sobre a denúncia.
Inquéritos
No caso desta adolescente, o obstetra será investigado em dois diferentes inquéritos policiais, de acordo com a titular da Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher (DECCM), a delegada Débora Mafra. Ele deve ser ouvido na próxima semana.
“Vamos notificá-lo para ouvi-lo. Ele tem que responder ao fato e mandaremos [o caso] para a Justiça em seguida. Ele vai responder por coação no curso do processo. Quando você está sendo indiciado, não pode fazer nada que interfira ou queira interromper e ser um obstáculo daqueles procedimentos criminal. Além de injúria e vias de fato no dia do parto da vítima”, disse a delegada.
Há cinco boletins de ocorrência contra o médico. Segundo Mafra, as enfermeiras também serão investigadas e podem ser chamadas para prestar depoimento.
“Temos mais cinco B.O.s (contra o médico) narrando fatos semelhantes ao que essa vítima fala: xingamentos, tapas e agressividade em um momento que deveria ser terno”, lamentou a delegada.
Secretaria abre investigação
Em nota, a Secretaria de Saúde disse que abriu sindicância para apurar a conduta do médico. Os documentos foram protocolados na secretaria nesta quarta-feira (20), pela direção da maternidade.
Também nesta quarta-feira, o secretário estadual de Saúde, Carlos Almeida, convocou a direção do Instituto de Ginecologia e Obstetrícia do Amazonas (Igoam), empresa ao qual o profissional é cooperado, para reunião na Susam, ocasião em que irá reiterar o pedido de afastamento do médico.
Violência obstétrica no Amazonas
A agressão sofrida pela adolescente em pleno trabalho de parto dentro de uma maternidade estadual, não é um caso isolado. Correm na Justiça 35 ações de indenizações por danos morais e materiais contra o Estado, ajuizados pela Defensoria Pública.
As ações de violência obstétrica datam os anos de 2009, 2013, 2015, 2016, 2017 e 2018. Nas ações, as mulheres denunciam demora no atendimento, ausência de exames, equipamentos e de profissionais habilitados, rompimento do órgão genital da gestante e placentas deixadas dentro da gestante.
Defensora Pública, Caroline Souza, explicou que a maioria das denúncias
que chegam são contra atendimento nas maternidades públicas
A defensora pública Caroline Souza explicou que a maioria das denúncias que chegam são contra atendimento nas maternidades públicas Ana Braga, Balbina Mestrinho e Nazira Daou.
“As ações contra o estado, são processos demorados, mas atuamos firmemente. Em alguns temos decisões favoráveis, mas a grande maioria esta em curso. O Estado recorre das decisões e a defensoria também recorre para aumentar os valores das indenizações, quando achamos que está abaixo do dano que a mulher sofreu”, explicou.
Ação coletiva
A fim de combater esta realidade, a defensoria formou uma comissão para vistoriar as maternidades. O resultado das inspeções irá munir uma ação coletiva.
“Esses fatos relatados que aconteceram recentemente não são isolados. Verificamos que precisávamos de uma ação mais contundente neste área e ingressar nessas maternidades para entender o que estava acontecendo. Foi formado uma comissão e vamos apurar. Dependendo do que for identificado iremos pedir o afastamento de profissionais. Tem maternidade que não tem UTIs funcionando”, disse Caroline.
Ela explicou que o órgão atua para reparar o dano de forma que haja uma compensação para essas famílias que ficaram com sequelas, ou para o pai que perdeu a esposa ou o filho.
“Existe processo em que o Estado foi condenado a pagar pensão vitalícia, em caso de morte. A pessoa deixa de contribuir para família”, disse.
Se o crime ocorrer em uma maternidade pública, a vítima tem até cinco anos para denunciar. Se for em um estabelecimento particular, o prazo prescricional é de 3 anos.
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