A expansão do Direito Penal na chamada “Era da sociedade de risco”
tem provocado, em uma frequência alucinante, processos de
criminalizações – primária, com edições de leis, e secundária, com
persecuções pelas agências de segurança pública e ações penais –, em
variados seguimentos do cotidiano social.
O grande marco temporal para essa “nova era” foi a financeirização da
economia, quando da globalização, que emprestou um novo significado aos
códigos do liberalismo.
Muito embora a consolidação desse processo tenha se apresentado
tardiamente no Brasil, tão somente na década de 1990, quando do governo
Collor, na Europa e na América do Norte já tinha se consolidado em
meados do início da década anterior, respectivamente, desde os governos
de Margaret Thatcher (Primeira-Ministra do Reino Unido de 1979 a 1990) e
Ronald Regan (Presidente dos Estados Unidos da América entre 1981 e
1989).
Com isso, o Direito Penal liberal, antes na posição de ultima ratio para a resolução dos problemas sociais, passou a fiscalizar/reprimir inúmeras modalidades de relações sociais.
Apenas para ilustrar a situação, estima-se que no Brasil há hoje
aproximadamente 1700 tipos penais, em contraste aos aproximados 400
existentes na década de 1980!
Daí que, como não poderia ser diferente, o sistema também se alastrou
para incidir, com maior frequência, inclusive nas relações dos médicos
com os pacientes. Soma-se a isso variados fatores que têm promovido o
aumento do número de processos em face de médicos, como a massiva
influência midiática, a precarização na formação profissional e das
prestações de serviço, baixas condições de trabalho, certa
conscientização da população acerca de seus direitos etc.
Neste sentido, há, basicamente, três grandes graus de
responsabilizações jurídicas na medicina: as sanções disciplinas
aplicadas nos processo ético-profissionais; as reparações de danos
morais e materiais do Direito Civil; e as condenações criminais que,
numa perspectiva liberal, possuem requisitos mais rígidos, diante da
maior gravidade das sanções.
Para o Direito Penal, que aqui nos interessa, há modalidades de
criminalizações tanto em tipificações específicas quanto em ações
proibidas que se enquadram em previsões mais genéricas.
Em relação às previsões mais genéricas, há o homicídio (art. 121,
CP), a lesão corporal (art. 129, CP), o constrangimento ilegal (art.
146, CP) etc. Tais incriminações comportam tanto a modalidade dolosa
quanto a culposa.
A responsabilização criminal do médico
As dolosas se dão através de condutas praticadas com a consciência e
vontade de, por exemplo, de constranger a realizar procedimento ou de
lesar o paciente. Registre-se que, ao contrário do que se possa
imaginar, geralmente, referidas atuações típicas não são “com
má-índole”, mas partem de decisões do médico em complexas situações,
como a realização de um procedimento cirúrgico sem o consentimento
válido do paciente, de tal sorte que, havendo lesão, se enquadraria no
artigo 129 do CP, e, caso não haja, no constrangimento ilegal do artigo
146 do CP.
Já as culposas se dão por erros médicos, que configuram a grande
parte das denúncias nos CRM’s, a partir da definição do artigo 29 do
Código de Ética Médica como: “é vedado ao médico praticar atos
profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como
imperícia, imprudência ou negligência”. Assim, há erro quando o
profissional descumpre algum dever de cuidado, seja quando não sabendo
fazer (imperícia), quando não faz com a atenção devida (imprudência) ou
quando negligenciou.
Recentemente, casos de cirurgia estética são campeões em erros médicos!
Já no que diz respeito às tipificações específicas para médicos,
tem-se a omissão de notificação de doença (art. 269, CP), a
esterilização irregular (art. 15, Lei n. 9.263/96, que dispõe sobre o
planejamento familiar), induzimento ou instigação dolosa à esterilização
cirúrgica (art. 17, Lei n. 9.263/96) etc.
Como se observa, a responsabilização criminal na medicina é muito
mais complexa do que, à primeira vista, pode-se imaginar, demandando um
estudo preparação cuidadosos dos agentes de segurança pública, da defesa
e do órgão julgador.
Canalcienciascriminais
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