A população gasparense sonha com o dia em que a saúde
pública será de qualidade e atenda com eficácia a demanda de todo o
município. Até que a cidade Coração do Vale alcance o que tanto almeja,
algumas precariedades envolvendo o Hospital Nossa Senhora do Perpétuo
Socorro e o descontentamento da comunidade seguem sendo registradas.
Uma família moradora da região Arraial
dos Claudinos, próxima à divisa com o bairro Macuco, passou por
umaituação inconveniente ao procurar a Casa de Saúde. Na noite de 2 de
maio, a costureira Eliane Zimmermann, juntamente com sua nora, levou a
neta de dois anos ao hospital. “Ela estava passando mal e, como temos
Unimed, iríamos à Blumenau. Mas, com a febre alta e tanto vômito,
resolvemos parar em Gaspar para ver se tinha pediatra”, conta.
De acordo com elas, ao chegar, se
depararam com uma grande fila. “Uma multidão esperava para ser atendida.
Acho que tinha umas 100 pessoas pro lado de fora. A recepção também
estava cheia. Todos amontoados”, descreve Eliane. Diante disso, ela
deixou a criança com a mãe na área externa e entrou para pedir
informações. “Perguntei se tinha algum médico disponível para dar
atenção para a menina, mas tinha só um Clínico Geral para atender todo
mundo”, completa.
Assustada com a realidade do Hospital de
Gaspar, Eliane questionou os recepcionistas sobre sugestões de médicos
particulares que atendessem durante a noite na cidade. “Falei que tinha
plano de saúde e que poderia pagar no dinheiro e queria uma indicação ou
telefone. Me responderam que não tinham e que, infelizmente, eu teria
que esperar”. A família então foi para Blumenau, onde o atendimento
aconteceu com rapidez.
Eliane afirma estar indignada com a
situação. “Ao sair, ouvimos um homem falar que a gente ainda tinha a
opção de pagar, mas que ele e a maioria daquelas pessoas que estavam na
fila, não”. A frase mexeu com a costureira, que se solidariza com os
demais pacientes: “Aquele povo deve ter virado a noite lá. Eu podia
fechar a minha boca e não arrumar confusão. Mas eu quero fazer a
diferença e cobrar dos políticos mais médicos”.
"Eu podia fechar a minha boca e não arrumar confusão. Mas eu quero fazer a diferença e cobrar dos políticos mais médicos”.
O depoimento de Eliane chama atenção e dá margem para diversas discussões. A principal delas diz respeito à procura pelo diagnóstico correto que possibilite o início de um tratamento eficaz que cure ou, se não for possível, ao menos devolva parte da qualidade de vida ao paciente.
Para analisar o atendimento na recepção e
informar com mais propriedade e clareza, a reportagem do Cruzeiro do
Vale foi até o Hospital Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Por volta das
10h30 de terça-feira, 7 de maio, os jornalistas se depararam com uma
família claramente abalada, já sem forças, às lágrimas.
Parentes de Marcos Antônio da Silva
(foto), internado desde o dia 27 de abril, enfrentavam o luto. Mãe,
filha, irmãos e sobrinhas lidavam com a notícia da morte de um homem
prestes a completar 52 anos. De acordo com Adriana Maria da Silva, irmã
da vítima, ele foi levado ao hospital com suspeita de úlcera e não
voltou mais.
Conforme ela conta, Marcos passou mal ao
sair do trabalho e reclamava de muita dor. Vizinhos chamaram o Corpo de
Bombeiros e ele foi encaminhado ao Hospital de Gaspar. “Foi atendido e
disseram que podia ser pedra nos rins e estavam avaliando se não era
apendicite. Ficou nesse empurra-empurra. Só na quinta-feira [2 de maio]
veio um cirurgião e disse que precisavam operar. E, mesmo naquele
estado, sem saber o que era, continuavam o alimentando”, conta.
Ainda segundo a família, os batimentos
cardíacos de Marcos estavam mais rápidos do que o normal. “Um outro
médico chegou e disse que meu irmão precisava de uma cirurgia urgente,
pois estava morrendo. Disseram que demorou mais tempo para limpar ele,
que estava todo infeccionado, do que para fazer o resto”, detalha
Adriana. Abalada, ela comenta que tudo poderia ter sido evitado. “No
sábado já deveriam ter feito uma bateria de exames. Se não dão conta,
deveriam ter mandado para Blumenau”.
No momento da entrevista, cerca de uma
hora após o falecimento de Marcos, a família ainda não sabia ao certo a
causa da morte. Mas, acreditavam ter sido uma úlcera.
“Ela entrou com suspeita de pedra na vesícula e saiu dentro de um caixão”
Ângela Maria Tanholi Schramm faleceu na
manhã de 5 de maio, aos 51 anos, no Hospital Nossa Senhora do Perpétuo
Socorro, onde esteve internada desde o dia 28 de abril. O marido, Sérgio
Schramm, exterioriza a dor que sente pela perda. “Ela entrou com
suspeita de pedra na vesícula e saiu dentro de um caixão”.
De acordo com a família, o problema de
Ângela, aparentemente, não era grave, mas foi se tornando maior com o
passar dos dias em que passou hospitalizada. O caso deixou a todos
preocupados. “Ela estava falando até a manhã de sábado [4 de maio].
Depois, foi entubada. Todos os parentes começaram a tentar agilizar uma
vaga em outra UTI da região. Afinal, se o hospital daqui não tem
estrutura, porque não transferiu logo?”, questiona Sérgio.
Direção do hospital se posiciona
Diretor administrativo do Hospital Nossa
Senhora do Perpétuo Socorro, Elson Marson Junior esclarece que está
ciente do falecimento dos pacientes Ângela e Marcos, mas garante que
tudo foi feito para evitar o pior. “Nós temos dificuldades financeiras.
Porém, a equipe é excelente, está em constante treinamento e, sim, fez o
possível para salvá-los”.
Ele ressalta que a causa da morte e
demais detalhes sobre os casos são secretos. “Tudo é guardado com sigilo
médico por uma questão de ética e respeito aos pacientes. Inclusive,
nem eu tenho acesso ao prontuário. A família precisaria autorizar”,
completa Elson. Quanto a não transferência, o diretor diz que o
procedimento foi aberto e planejado corretamente, mas Gaspar dependia de
outros fatores para efetivar a mudança.
A gerente de Enfermagem do Hospital de
Gaspar, Maria Gilvani Kinel, também destaca que todos os casos são
tratados com seriedade. “Os atendimentos exigem de nós e também de
fatores externos, no caso de transferências, por exemplo. A gente perde,
infelizmente. Mas nós também salvamos muitas vidas”.
Sobre a situação relatada por Eliane
Zimmermann, a diretoria do hospital pede desculpas. “A gente lamenta não
ter dado a assistência necessária. É imprescindível que, na próxima
vinda, você se identifique na recepção, peça para falar com algum
enfermeiro e aguarde pelo atendimento. Se quiser um esclarecimento
maior, pode vir conversar conosco. Estamos à disposição”.
Ao longo do dia 2 de maio, data em que
Eliane levou a neta ao hospital, foram registrados 133 atendimentos no
Pronto Socorro. Além disso, 55 pessoas passaram pelo ambulatório e sete
pelo centro obstétrico. Foram registradas ainda quatro cirurgias, a
presença de 27 pacientes internados e um nascimento.
A orientação da diretoria é que qualquer
pessoa que procure o hospital preencha a ficha na recepção e sigam as
orientações dos recepcionistas e enfermeiros, pois facilita a
organização. Dessa forma, os pacientes passam por uma triagem, momento
em que são verificadas a pressão, temperatura e frequência respiratória.
A prioridade vai para quem apresentar dores no peito, febre alta,
diabetes e também crianças.
“Nós temos dificuldades financeiras. Porém, a equipe é
excelente, está em constante treinamento e, sim, fez o possível para
salvá-los”.
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